tag:blogger.com,1999:blog-6671312260866909102023-11-15T12:43:27.217-03:00CI VEDO DOVE SONOO blogue é um espaço de exercício de escrita e, portanto, de reflexão. Idealmente, mobilizará alguns leitores.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.comBlogger29125tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-30555652214331200192013-09-28T10:27:00.001-03:002013-09-28T19:58:48.577-03:00METODOLOGIA DE PESQUISA INTERPRETATIVA (RELATÓRIO DE CURSO)<i>NOTA EXPLICATIVA</i><br />
<br />
<i>O texto abaixo é um relatório feito por mim, sob solicitação do Prof. Dr. Pedro M. Garcez, para o Curso Livre METODOLOGIA DE PESQUISA INTERPRETATIVA, ministrado por ele no PPG/Letras da UFRGS em maio e junho de 2013. Tendo sido avaliado como "plenamente satisfatório", publico-o aqui para que possa servir a outros pesquisadores interessados nessa metodologia. Escusado seria dizê-lo, mas, apesar da avaliação favorável, eventuais falhas de compreensão se deverão exclusivamente ao relator. Aproveito, por fim, para agradecer ao Professor as aulas e o incentivo.</i><br />
<br />
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS)<br />
INSTITUTO DE LETRAS – PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (PPG/LETRAS)<br />
ESTUDOS DA LINGUAGEM – LINGUÍSTICA APLICADA<br />
<br />
Disciplina: METODOLOGIA DE PESQUISA INTERPRETATIVA <br />
(LET 00002 – CURSO LIVRE, 2013/1)<br />
Professor: PEDRO M. GARCEZ, PhD<br />
Aluno: Conrado Abreu Chagas<br />
Data: Maio/junho de 2013<br />
<br />
<br />
<b>RELATÓRIO DE CURSO</b><br />
<br />
<i>Conrado Abreu Chagas*</i><br />
<br />
Nos quatro encontros do curso, o Prof. Pedro Garcez buscou apresentar aos alunos em que consistia a metodologia de pesquisa interpretativa. De saída, informou-nos que o curso lhe fora solicitado e que, a depender somente de si, possivelmente não o daria. A razão, algo incompreensível de início, se fez inteiramente clara no decorrer das aulas. Primeiramente, trata-se de assunto bastante complexo para apenas quatro encontros. Depois, e talvez mais importante, ainda que seja especialista nessa abordagem metodológica, encontra-se o Professor numa posição de pesquisador que vai muito além de mero “leitor” de métodos.<br />
<br />
O próximo passo foi inquirir dos alunos o que buscavam ali exatamente, ou seja, em que medida a abordagem metodológica a ser ali exposta se ajustava àquilo que andavam pesquisando ou planejavam pesquisar. Todos tivemos espaço e tempo para informar a ele e ao grupo por que fazíamos o curso, enquanto o Professor tomava nota, literalmente. Da fala de todos, salvo as exceções do costume, pôde-se perceber que o conhecimento sobre método interpretativo era ainda bastante incipiente. Não creio que o Professor esperasse outra coisa, a despeito das leituras que, por e-mail, nos havia proposto, as quais todos àquela altura já teríamos feito ou, ao menos, andássemos fazendo.(1)<br />
<br />
As aulas tiveram uma dinâmica regular e quase invariável. À frente do grupo em forma de semicírculo estava o Professor, e atrás deste, em tela, um roteiro, que foi rigorosamente seguido. O modo de exposição do conteúdo foi dialogado, ainda que, por razões óbvias, com turnos bem maiores do Professor. No início de cada encontro (à exceção, por razões práticas, do último), o Professor, ao retomar a aula anterior, solicitava aos alunos que se pronunciassem livremente sobre dúvidas, considerações ou observações que julgassem pertinentes. <br />
<br />
Essa, portanto, a forma. Quanto ao conteúdo, partiu-se do próprio termo “interpretativo”, ao qual se deu preferência em detrimento do termo “qualitativo”. As razões dessa opção foram mais ou menos aquelas apresentadas em Erickson: (a) mais inclusivo; (b) evita a conotação de “não quantitativo”, presente no termo “qualitativo”; e (c) indica a característica-chave da metodologia interpretativa: o interesse no significado humano da vida em sociedade e em sua elucidação e exposição pelo pesquisador.<br />
<br />
A grande questão que se põe o pesquisador que se utiliza do método interpretativo é “O que está acontecendo aqui?”. A resposta a essa questão, porém, não se dará apenas a partir do ponto de vista do pesquisador, ainda que não se possa esconder e/ou neutralizar esse ponto de vista: deve-se levar em conta, como fundamental, o ponto de vista das pessoas que atuam no ambiente estudado. Nesse sentido, será o próprio pesquisador, mesmo que desejasse diversamente, também um desses atores.<br />
<br />
Mas no que, então, se distinguem as demais pessoas que fazem parte daquele cenário sob estudo e o pesquisador? Já não me recordo se foi Erickson, Mason ou Garcez que, em tom de brincadeira, mas com muita eficácia didática, observou que “o último a descobrir a existência da água seria provavelmente o peixe”.(2) Com efeito, a vida cotidiana se torna invisível para aqueles que transitam localmente. <br />
<br />
Parece residir aí um paradoxo: sem “entrar” efetivamente na comunidade estudada, não terá o pesquisador condições de compreendê-la (ao menos não se quiser ir além da relação causa e efeito, ou sujeito e objeto, característica de uma abordagem quantitativa <i>tout court</i>). Ao mesmo tempo, se essa “entrada” se der integralmente, já não terá mais o pesquisador como analisar o que se lhe põe diante dos olhos, pois talvez sequer o veja!<br />
<br />
A resolução desse aparente paradoxo residiria na observação de Erickson de que o “sense-making is the heart of the matter”. E o sentido está nas ações, não no comportamento. Nisto se distinguirá a abordagem interpretativa da abordagem comportamentalista/behaviorista: à segunda basta analisar o comportamento, ao passo que à primeira importam o comportamento e seu significado social, ou seja, a ação.<br />
<br />
A ação se depreende dos eventos. “Ver” os eventos é poder extrair-lhes as ações. Jung (2009), remetendo-nos a Erickson, nos fala do conceito de “estranhamento”: “um esforço sistemático no sentido de estranhar uma situação já familiar” (p.73). (3) Não chegamos a comentá-lo em aula, mas não é improvável que aqui Erickson se tenha valido da noção platônica de “espanto” ou “admiração”, como aparece no diálogo do velho Sócrates com o jovem Teeteto. Em todo o caso, não será talvez incorreto dizer que é o estranhamento “o fio de Ariadne” que permite ao pesquisador participar localmente da comunidade que está estudando, sem por isso deixar de ser “reflexivo”, ou seja, sem que abdique de buscar identificar o significado das ações nos eventos cotidianos a partir do ponto de vista dos próprios atores.<br />
<br />
O significado das ações se encontraria, assim, na comparação entre o que nelas há de local e não local. Daí a importância, na pesquisa de Jung, por exemplo, de ir além do espaço “sala de aula” e mesmo “escola”, de ir à comunidade, de ir à casa dos alunos e seus pais, à igreja, de compreender até a própria formação geográfica e histórica do município. O fato de o uso do alemão e do português naquela comunidade estar associado à questão do gênero dos falantes só pôde ser desvendado pela “triangulação” de interpretações buscadas em ambientes distintos, ainda que intimamente conectados. <br />
<br />
Em termos estritamente metodológicos, vale salientar a observação do Professor de que é ingenuidade crer que se possa entrar em campo de mãos vazias. Nesse sentido, o manual de Mason é bastante relevante, uma vez que nos dá, passo a passo, um procedimento pré-campo, se assim nos podemos expressar. Do quebra-cabeça inicial vão se construindo as perguntas, e destas os procedimentos de pesquisa. Cabe aqui observar que, em seu relatório, Jung reserva todo um capítulo em que nos apresenta um referencial teórico muito bem sedimentado. Não é improvável que parte desse referencial se tenha construído contemporaneamente à atuação da pesquisadora em campo. Registre-se, em todo caso, que com toda a certeza essa pesquisadora não entrou em campo sem perguntas. <br />
<br />
E já que falamos em perguntas, cabe aqui distingui-las de hipóteses. Uma hipótese (do grego <i>hypo</i> + <i>tithenai</i>: embaixo/sob + pôr) é uma conjectura, uma presunção, o que em si pressupõe já uma resposta, ainda que provisória, a confirmar-se ou não (daí seu sentido etimológico de estar “na base”). Uma pergunta quer evidentemente uma resposta, mas não a pressupõe necessariamente. É a hipótese, portanto, uma antecipação, ao passo que a pergunta tenderá antes a organizar de preferência a antecipar. A hipótese tem de necessariamente ser comprovável, e essa comprovação ou rejeição dependerá de dados que são normalmente “coletados”. Já a pergunta, ao menos em pesquisa interpretativa, será respondida ou não, igualmente a partir de dados, mas estes não são “coletados”, como se estivessem no mundo a esperar que os apanhássemos. Sendo a busca de sentido “the heart of the matter”, e estando esse sentido presente nas ações das pessoas envolvidas em dado cenário, e entre elas o próprio pesquisador, os dados se dirão judiciosamente “gerados”, e não “coletados”: são eles na verdade “produzidos”, mas não num sentido contrafeito ou falso. Longe disso! Falar em produção ou geração de dados é, antes, um modo de encarar sinceramente o fato de não poder haver de fato neutralidade nem objetividade absolutas em grande parte das ciências humanas. <br />
<br />
Isso nos leva agora à noção de “plausibilidade”. Se a partir de hipóteses, por meio de provas ou refutações, se chega a generalizações (quiçá mesmo a princípios de valor universal), em pesquisa interpretativa pode-se também chegar a padrões de generalização. O critério de validade aqui não será, porém, o silogismo ou a relação de causa e efeito, mas antes a “persuasão”. O pesquisador, agora autor e “responsável” por seu discurso, que se materializa num “relatório de pesquisa”, convidará o leitor a refletir consigo, apresentando-lhe e analisando com ele os dados produzidos. O leitor terá visto como esses dados foram produzidos e verá a seguir como eles podem ser analisados. O leitor será assim o “coanalista”. Não será ele o responsável pela análise, assim como não o fora pela produção dos dados. O responsável será sempre o pesquisador. Mas o leitor será convidado a analisar conjuntamente, a avaliar junto com o pesquisador e autor do relatório a relevância, a pertinência, numa palavra, a plausibilidade dos dados. O autor convidará, assim, seu leitor a “ver” o mundo para além dos dados em si, ainda que estes sejam a porta de ingresso àquele.<br />
<br />
Como se pode ver, estamos já no relatório, tema detidamente tratado no último encontro. A sugestão que nos deu o Professor quando da apresentação e análise dos dados é a de que procurássemos ser diretos, sem rodeios, e isso desde o título da seção ou capítulo em que fôssemos apresentar nossa análise. A unidade que utilizou foi a “asserção”. Essa deveria, já dissemos, vir enunciada já no título da seção (ou capítulo). A seguir, como introdução, a sugestão é a de fazer-se um comentário interpretativo dessa asserção. Logo a seguir, apresenta-se então o dado. Este deve obviamente ser situado, e bem situado, e então, e só então, reproduzido. E que não se fique aí: é evidente que esse dado precisa ser detidamente analisado. A seção se concluirá com um comentário interpretativo de retomada, como se perguntássemos a nosso coanalista-leitor: “Você viu?”<br />
<br />
Haveria decerto muito mais a dizer, mas, como isto já vai se estendendo além do planejado, quero concluir com apenas mais um comentário. Esse tem a ver com o que em aula se nomeou “contraindicações”: aquilo que aponta numa direção diversa daquela que até então, a partir de outros dados, pensávamos que fosse a direção plausível. O procedimento aqui, nos diz o Professor, é justamente o de investigar esse dado divergente. Mais: é preciso mesmo buscá-lo. A persuasão será tanto mais eficiente quanto mais abrirmos o flanco. Não nos queremos suicidar, bem entendido! A ideia é bem outra: no relatório, o autor “abre o flanco” a fim de buscar justamente defender-se analiticamente, e o faz sempre convidando o leitor a entender consigo a plausibilidade dos padrões de generalizações que avança. <br />
<br />
<b>AVALIAÇÃO</b><br />
<br />
Como já mencionei no início deste relatório, o tema do curso pede mais tempo para ser tratado. O modo como nos foi apresentado e as leituras bem selecionadas a que tivemos acesso nos permitiram, no entanto, ter já uma ideia bastante boa do assunto; ao menos abriu-nos uma porta de acesso. Meu relatório se ressentirá talvez da pouca profundidade de minha leitura, assim como da atenção deficiente que pude dar a tantos e tão variados detalhes a envolverem o assunto. Que se registre, porém, que nunca esse relatório se quis exaustivo, nem será essa a expectativa do Professor. Não obstante, conto com que alguns pontos relevantes tenham sido abordados e, dentro de meus limites, adequadamente desenvolvidos.<br />
<br />
Vim fazer este curso por indicação de minha orientadora, a Prof.ª Luciene Simões, que viu nele uma excelente oportunidade de eu tomar conhecimento da metodologia interpretativa. Creio que não se enganou.<br />
<br />
Ainda estamos no início de nosso trabalho (ingressei agora em março de 2013) e, portanto, não será ainda possível dizer com certeza se de fato a melhor abordagem é esta, ou será outra (ando um tanto ansioso com isso, naturalmente). Não é improvável que devamos ter de usar mais de uma. Foi o que imaginei quando escrevi o projeto de ingresso, nisso me baseando em pesquisas de W. Labov, P. Eckert, L. Milroy, S. Gal e S. M. Bortoni-Ricardo, ou no que entendi ser a metodologia lá empregada.<br />
<br />
Das leituras sugeridas, me agradaram muitíssimo Erickson e Jung. Garcez, por muito breve e ao mesmo tempo amplíssimo, e Mason, por ir “além de espaços educacionais”, me atraíram menos. É possível que me equivoque e não é improvável que volte a essas referências <i>in due course</i>.<br />
<br />
É evidente que, no curto espaço de quatro encontros, não houve tempo para exercícios, mas talvez pudéssemos (como sugeriu uma colega na última aula) fazer todos a leitura de um mesmo relatório, o qual nos serviria de referência para pontos específicos quando necessitássemos de alguma ilustração.<br />
<br />
<i>*Professor de Língua Inglesa e Língua Portuguesa e Literatura do Instituto Federal Sul-Rio-Grandense (IFSul – Câmpus Charqueadas), mestre em Estudos da Linguagem pela UFRGS e aluno de doutorado do PPG/Letras da UFRGS. <br />
</i><br />
<br />
<b>NOTAS</b><br />
<br />
(1) ERICKSON, F. (1990) Qualitative Methods. In R. L. Linn & F. Erickson (Orgs.), <i>Quantitative Methods; Qualitative Methods</i> (Vol. 2, pp. 75-194). Nova York: Macmillan.<br />
<br />
GARCEZ, P. M. (2008) Microethnography in the Classroom. In K. King & N. H. Hornberger (Orgs.), <i>The Encyclopedia of Language and Education, Vol. 10, Research Methods in Language and Education</i> (pp. 257-272). Berlim: Springer.<br />
<br />
MASON, J. (1996) <i>Qualitative Researching</i>. Londres: Sage.<br />
<br />
(2) O prof. Pedro Garcez, em comentário a este relatório, faz neste ponto a seguinte observação: “Acho que nenhum desses, que já repetem o que alguém disse antes”.<br />
<br />
(3) O Prof. Pedro Garcez nos solicitou a leitura de um relatório de pesquisa interpretativa, e a minha escolha foi a tese de doutorado de Neiva Maria Jung: <i>A (Re)produção de Identidades Sociais: na Comunidade e na Escola.</i> Ponta Grossa: Editora UEPG, 2009.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-49193486684180140702013-08-08T15:11:00.001-03:002013-08-08T16:36:28.578-03:00NO DENTISTA, OU DA RESPONSABILIDADE SOCIALNada como um cigarro depois do dentista. Um crime depois de sair da prisão. A gente não tem mesmo jeito. Eu, ao menos, pareço não ter. <br />
<br />
Consegui finalmente ser atendido para que se fizesse a restauração do dente 26, depois do canal. É estranho que o dentista que tratou o canal (o “endodontista”) não tivesse ele mesmo feito a restauração, tendo apenas deixado ali algo provisório. É a especialização crescente dos saberes, o fim da “clínica geral”, por assim dizer.<br />
<br />
Isso não era o que acontecia antes. A Dr.ª Neli Susin, por exemplo, fazia tudo, do princípio ao fim, e não era por falta de especialização, pois havia estudado clínica odontológica inclusive no Canadá. Tão logo a gente se deitava na sua cadeira, e já na primeira consulta, ela dava início ao tratamento, enquanto anotava no prontuário tudo que era preciso ser feito. Em mais alguns encontros, dependendo do caso, tínhamos alta.<br />
<br />
– Volta daqui a uns seis meses, ok? – E eu voltava, sempre.<br />
<br />
E a Neli tinha preços diferenciados. Na primeira consulta que tive com ela, me fez uma série de perguntas, quando descobriu coisas relevantes como o time de futebol para o qual eu torcia e o quanto ganhava por mês, entre outros dados. Dependendo da renda e outras informações relacionadas de classificação nos estratos sociais, ela cobrava um ou outro valor. A coisa era simples: os mais pobres pagavam menos; os mais ricos, mais. E ponto final. Não é improvável que o time de futebol tivesse também peso nessa classificação socioeconômica.<br />
<br />
– Quer saber como eu acabei torcendo para o Grêmio? – me perguntou um dia. <br />
<br />
– Hum... <br />
<br />
(Os dentistas nem sempre se lembram de que não temos como responder-lhes senão, e muito modestamente, sim ou não.)<br />
<br />
– Eu nunca dei bola pra futebol – continuou. – Mas tinha um namoradinho, de quem gostava bastante, que adorava esse esporte. Um dia ele me perguntou se eu era gremista ou colorada, e eu lhe respondi com outra pergunta, na verdade a mesma. Ele me respondeu que era colorado, claro! “Então eu sou gremista”, eu disse. E desde então sou gremista.<br />
<br />
Me veio uma vontade louca de dar uma gargalhada, mas não pude, não tinha como. Que merda! Ela riu bastante por nós dois.<br />
<br />
Essa era a Neli.<br />
<br />
Mas voltemos ao dente 26. Consegui, depois de haverem desmarcado duas vezes, que retirassem a coisa provisória que o endodontista havia colado ali depois do canal e fechassem adequadamente o tal dente. Um alívio!<br />
<br />
Enquanto se preparava para iniciar o trabalho, o dentista comentou (já não sei por que cargas d’água) que ia com frequência ao presídio, fazer implantes e branqueamentos nos presos.<br />
<br />
– Devem ser presos com dinheiro – observei, porque, o procedimento não tendo ainda começado, era possível ainda dizer mais do que apenas “hum” (= sim) ou “hum.. hum” (= não). E perguntei:<br />
<br />
– São assaltantes de bancos?<br />
<br />
– Traficantes, acho – respondeu o dentista. – O branqueamento é a primeira coisa que querem, mas também faço muitos implantes. Ter belos dentes é uma questão de status no presídio.<br />
<br />
– É mesmo?<br />
<br />
– Ah é, sim!<br />
<br />
– O Brasil já foi o país dos desdentados, não é? – falei, sem saber mais que dizer e pensando que talvez isso fosse a última coisa antes dos iminentes sim e não.<br />
<br />
– Ainda é, embora talvez menos que antes – ele disse.<br />
<br />
– E os dentistas têm sua dose de culpa nisso, não é verdade? – provoquei, enquanto ele já me pedia para abrir a boca. Na verdade, pelo seu olhar, o que talvez ele neste momento desejasse mesmo era que eu a fechasse.<br />
<br />
Houve um silêncio. Eu agora já não podia dizer mais senão “hum” e “hum... hum”, que só servem apropriadamente para resposta, ao passo que ele, que podia falar quanto quisesse, guardou um silêncio pensativo.<br />
<br />
Depois de certo tempo, disse:<br />
<br />
– A responsabilidade é antes do poder público. Se houvesse serviço de odontologia disponível e de qualidade para a população, deixaríamos de ser “o país dos desdentados”.<br />
<br />
A conversa morreu ali. Os pensamentos sobre o assunto, no entanto, seguiram. Os meus certamente, mas tenho pra mim que assim também os dele.<br />
<br />
Esse dentista que me atendia era com certeza um homem bem-sucedido. Não tenho por que duvidar de sua competência e de que o sucesso evidente naquele centro odontológico bem equipado era fruto de trabalho sério e dedicado. Contudo, fiquei a pensar no papel social dos profissionais liberais e de como todos nós sempre atiramos no colo do poder público tudo quanto nos vêm cobrar de não estarmos fazendo. É evidente que, porque pagam seus impostos (os quais não serão decerto poucos), esses profissionais entendem, talvez não sem razão, que já estão fazendo a sua parte e de modo algum indo contra o juramento republicano que na formatura tão solenemente fizeram. <br />
<br />
Ainda assim, me incomodou o fato de ele ir ao presídio atender aos traficantes. Num certo sentido, talvez forçando a barra um bocado, admito, podia mesmo dizer-se que trabalhava para eles, não? De onde aqueles presos tiravam o dinheiro grosso para dar-se ao luxo de fazer implantes e branqueamentos senão da miséria alheia? Teria esse mesmo dentista o cuidado em atender presos despossuídos de poder econômico, disponibilizando parte de seu tempo semanal ou até mensal para, não digo fazer tratamentos caros, mas ao menos alguma obturação ou mesmo extração, aliviando o sofrimento daquelas criaturas encarceradas? São presos, claro, e, se ali estão, algo de errado, de criminoso, supostamente fizeram, certo? Mas também os outros, os ricos do presídio, não estão ali certamente por algum prêmio. A diferença é o poder econômico de uns contra outros, não é?<br />
<br />
Mas dos desvalidos cuide o poder público. Um profissional liberal bem-sucedido já dá sua cota de contribuição ao pagar seus impostos, correto?<br />
<br />
Já na sala de recepção, enquanto estendia o cartão de crédito para pagar o tratamento recebido, a secretária sorridente me pergunta:<br />
<br />
– O senhor vai precisar de recibo para o imposto de renda?<br />
<br />
A pergunta fazia sentido e em nada a princípio desabonava a clínica e seu proprietário, evidentemente. Afinal, podia dar-se bem o caso de minha renda anual estar abaixo do valor a partir do qual se paga imposto, não havendo, portanto, necessidade alguma de minha parte que me dessem um recibo para o imposto de renda, pois não haveria necessidade nem lugar para pedido de restituição.<br />
<br />
Enquanto acendia o cigarro, em direção ao carro, com o recibo na mão, não pude deixar de perguntar a mim mesmo se não era obrigação de todo prestador de serviço dar o recibo para o imposto de renda, houvesse ou não necessidade do documento. Pois é, pensei, talvez o recibo não fosse mesmo preciso nesses casos, e eu é que estava de má disposição contra o dentista. Aquela história dos presos, do poder público, de eu ter de voltar para que me fechassem o dente depois de duas tentativas frustradas, tudo aquilo me deixara certamente de mal humor.<br />
<br />
De uma coisa, no entanto, tenho plena certeza: os traficantes do presídio, esses não pedem recibo algum. Ou pedirão?PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-2752377791306270942012-09-29T21:15:00.002-03:002012-09-29T21:30:03.524-03:00ENTRE BESTEIRAS GERAIS E ESPECÍFICASJá faz um bom tempo que não escrevo neste espaço. Não seria exato, porém, dizer que nada tinha para escrever, pois nestes últimos tempos venho estudando muito e ando mesmo bastante focado. Assim, creio que deixei de lado meu blogue não porque não tivesse o que dizer, mas antes por uma certa indefinição de minha parte quanto à cara dele.<br />
<br />
Me explico. Este espaço me pareceu de início um local adequado para dar, como se diz, "pitacos" sobre isso e aquilo. Logo percebi, no entanto, que dar palpites sobre coisas que nem sempre nos são familiares (e muitas nos são estranhas) pode ser perigoso, no mínimo, digamos, vergonhoso a quem o faz. Não tendo grande conhecimento das coisas, por que vamos querer atirar aos sete ventos nossa exímia ignorância? O silencioso pode passar por sábio, o falastrão nunca.<br />
<br />
Conclusão: melhor calar-se!<br />
<br />
Mas e se, tendo estudado isso e mais aquilo (que sempre se estuda um bocadinho), nos puséssemos tão somente a comentar sobre o estudado, especificamente? Decerto a amplitude das besteiras seria menor, ao menos mais dificilmente discernível. Aqui, evidentemente, haverá sempre o risco de se especializar demasiado o espaço, de modo que já não sirva senão a quem tenha o mesmo interesse diminuto, e olhe lá!<br />
<br />
Assim, entre escrever bobagens gerais ou muito específicas, acabei silencioso como a letra H, na astuta esperança de que, se nunca me tivessem por sábio, ao menos não me tomassem por tolo.<br />
<br />
<br />
<br />
PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-56358386381209533322012-03-14T16:53:00.000-03:002012-03-14T16:53:38.922-03:00SEM ELE, O MUNDO VAI BEMHouve um tempo em que morreria peleando pela ideia de que ler é fundamental para a educação dos jovens. Era então a formação do leitor a atividade primeira que eu supunha dever a escola desempenhar. Hoje ando mudado. Dos hábitos (bons e maus) que se me foram arraigando vida afora, um será decerto a leitura: não vou a lugar algum sem pelo menos um livro, no mínimo uma revista ou jornal (e, agora que descobri o Kindle, levo antes uma biblioteca!). Todavia, já não creio que esse mesmo hábito, que julgo prima facie bom e até louvável, deva ser objeto de proselitismo. E não se trata de laisser-faire, de I don't care, nada disso! O laisser-faire pode às vezes revelar-se covardia, e o I don't care pura irresponsabilidade. Ora, eu... I do care! Só não acho mais que... bom lá vai: só não acho mais que ler seja mesmo fundamental, pronto.<br />
<br />
Não parece haver dúvida de que as sociedades letradas se desenvolveram mais do que aquelas em que pouca ou nenhuma atenção se deu à escrita. Igualmente, são de preferência dominantes as línguas que se lastreiam num sistema definido de escrita, sobretudo se esse sistema, respaldado em gramáticas e dicionários, tiver dado ensejo à produção de considerável arcabouço literário. Assim também, é o que nos parece, igualmente no plano individual, será mais bem sucedido aquele que demonstrar melhor comando da escrita, aquele cujo grau de letramento se revelar superior. O argumento aqui é, pois, de ordem prática: aprende a ler e a escrever bem, aprende, portanto, o teu bocado de gramática e desenvolve-o, que assim aumentarás tuas chances de um dia vires a te dar bem na vida.<br />
<br />
Ler e escrever seriam, portanto, habilidades instrumentais para a ascensão social, tanto no nível macro, aquele de uma nação ou comunidade, quando no micro, naquele do indivíduo dentro de uma comunidade. <br />
<br />
Observe-se, no entanto, que essa instrumentalização vem, mal ou bem, sendo feita na escola, seguindo-se depois no mundo do trabalho. Aprendemos a ler na infância e vamos lendo vida afora, atravessando de baixo a alto o sistema educacional, para a seguir, já no mundo do trabalho, darmos sequência à nossa formação, sempre cerrando mais e mais o foco. O problema aqui, me parece, não são aqueles que seguem o sistema educacional, senão aqueles, que por diversas razões, têm de abandoná-lo. Portanto, se tu seguires firme teu caminho dentro dos muros das instituições de ensino (sejam estas excelentes, médias ou mesmo ruins), tu encontrarás um dia de certeza teu lugarzinho ao sol. Never mind! Se apeares desse bonde do progresso, aí as coisas podem ficar ruinzinhas, bem ruinzinhas (ainda que se verifiquem, a confirmar a regra geral, as exceções do costume).<br />
<br />
Mas quando lá atrás eu me batia pela formação do leitor na escola, juro que jamais cruzou pela minha cabeça essa ideia precípua de instrumentalização. No que pensava então era antes na leitura feita pelo único gosto de ler, pelo puro prazer de gozar, de fruir da leitura. E esta leitura, este tipo de abordagem é que me parecia fundamental na educação de nossos alunos; era essa leitura a que justamente se fazia (e se faz ainda) rara no ambiente escolar e na vida.<br />
<br />
Como disse, ando mudado. Já não creio que ler assim seja de fato fundamental. Tenho conhecido homens bons e homens maus, felizes e infelizes, hipócritas e sinceros, ingênuos e matreiros, homens sábios e homens loucos, criativos e tansos, mas poucos de fato se qualificariam como cultores desse tipo “desinteressado” de leitura. Entenda-se que quase todos leem, claro, mas o fazem antes por dever da profissão, por mister tão somente. <br />
<br />
O leitor por gosto, descomprometido, o leitor de romances, de poemas e contos, o leitor de longas obras escritas por autores há muito falecidos, esse leitor é raro. <br />
<br />
Hoje estou convencido de que o mundo simplesmente não precisa desse leitor.<br />
<br />
Sem ele, o mundo vai muitíssimo bem, obrigado.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com13tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-69335868596676872022012-01-15T16:34:00.001-02:002012-01-15T16:43:43.969-02:00O CÂNTICO DAS CRIATURASOlá, amigos leitores!<br />
<br />
Faz já quatro semanas que não escrevo nada novo para este blogue. Quis dar um tempo, uma folga para mim (estou de férias) e também para quem me lê. Volto hoje, porém, e com mais uma tradução, e outra vez do italiano. Apenas, desta vez não é o italiano padrão, de origem toscana, senão uma variação deste, em dialeto medieval úmbrio. <br />
<br />
Muitos de meus leitores decerto já conhecerão este texto. Trata-se de "O Cântico das Criaturas", também conhecido como "O Cântico do Irmão Sol". O autor é São Francisco de Assis, que o teria ditado, pelo menos parte dele, já no leito de morte.<br />
<br />
São Francisco pertencia à classe emergente dos comerciantes, dos burgueses; por isso, teve boa educação, sabia o latim, etc. Contudo, o Cântico, diferentemente dos demais textos do grande gênio religioso, foi escrito diretamente na língua falada na Úmbria então. Por isso, tem esse texto também uma importância de documento literário, sendo um dos primeiros textos a compor o que hoje chamamos de literatura italiana. <br />
<br />
São Francisco, como sabemos, era músico e gostava de cantar. Não é, portanto, improvável que esse cântico, esse hino de fé e otimismo, assim como aquele de Davi que ele parafraseia (salmo 148), fosse cantado; seria então, na verdade, o que hoje chamamos de letra de música. Vejam só!<br />
<br />
Fim de papo.<br />
<br />
Boa leitura e grande abraço!<br />
<br />
CANTICO DELLE CREATURE<br />
<br />
Altissimu, onnipotente bon Signore,<br />
Tue so' le laude, la gloria e l'honore et onne benedictione.<br />
Ad Te solo, Altissimo, se konfano,<br />
et nullu homo ène dignu te mentovare.<br />
<br />
Laudato sie, mi' Signore cum tucte le Tue creature,<br />
spetialmente messor lo frate Sole,<br />
lo qual è iorno, et allumini noi per lui.<br />
Et ellu è bellu e radiante cum grande splendore:<br />
de Te, Altissimo, porta significatione.<br />
<br />
Laudato si', mi Signore, per sora Luna e le stelle:<br />
in celu l'ài formate clarite et pretiose et belle.<br />
<br />
Laudato si', mi' Signore, per frate Vento<br />
et per aere et nubilo et sereno et onne tempo,<br />
per lo quale, a le Tue creature dài sustentamento.<br />
<br />
Laudato si', mi Signore, per sor'Acqua.<br />
la quale è multo utile et humile et pretiosa et casta.<br />
<br />
Laudato si', mi Signore, per frate Focu,<br />
per lo quale ennallumini la nocte:<br />
ed ello è bello et iocundo et robustoso et forte.<br />
<br />
Laudato si', mi Signore, per sora nostra matre Terra,<br />
la quale ne sustenta et governa,<br />
et produce diversi fructi con coloriti fior et herba.<br />
<br />
Laudato si', mi Signore, per quelli che perdonano per lo Tuo amore<br />
et sostengono infrmitate et tribulatione.<br />
<br />
Beati quelli ke 'l sosterranno in pace,<br />
ka da Te, Altissimo, sirano incoronati.<br />
<br />
Laudato s' mi Signore, per sora nostra Morte corporale,<br />
da la quale nullu homo vivente pò skappare:<br />
guai a quelli ke morrano ne le peccata mortali;<br />
beati quelli ke trovarà ne le Tue sanctissime voluntati,<br />
ka la morte secunda no 'l farrà male.<br />
<br />
Laudate et benedicete mi Signore et rengratiate<br />
e serviateli cum grande humilitate.<br />
<br />
<br />
O CÂNTICO DAS CRIATURAS (tradução)<br />
<br />
Altíssimo, onipotente e bom Senhor,<br />
para ti sejam os louvores, a glória e a honra, e mais todas as bênçãos,<br />
pois essas coisas todas, Altíssimo, somente a ti é que convêm<br />
quando homem algum é digno sequer de mencionar-te.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, com todas as tuas criaturas,<br />
especialmente o irmão Sol,<br />
que nos dá o dia, sendo por ele que tu nos iluminas.<br />
E o Sol é belo e radiante.<br />
Com grande esplendor, ele é de ti, Altíssimo, a própria imagem.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã Lua e as estrelas:<br />
no céu tu as soubeste fazer resplandecentes, preciosas e belas.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, pelo irmão Vento<br />
e pelo ar que movimenta, tornando o dia nebuloso ou sereno,<br />
pouco importa, pois sempre é por ele que nos dás o sustento.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã Água,<br />
que, embora humilde, é sempre tão útil e muito preciosa.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, pelo irmão Fogo,<br />
por meio do qual podemos iluminar e aquecer as noites:<br />
como ele é belo e alegre e robusto e forte!<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã Terra, <br />
que também é mãe nossa, pois nos sustenta e governa,<br />
e produz frutas diversas e coloridas flores e ervas.<br />
<br />
Louvado sejas, meu Senhor, por aqueles que perdoam por amor a ti<br />
e suportam doenças e aflições.<br />
<br />
Benditos aqueles que souberem enfrentar pacificamente os problemas,<br />
porque tu, Altíssimo, saberás recompensá-los.<br />
<br />
E louvado sejas, meu Senhor, até por nossa Morte, <br />
que também é irmã nossa,<br />
pois dela ninguém que viva pode escapar.<br />
E ai daqueles que morrem em pecado mortal!<br />
Mas benditos aqueles que, ao morrerem, tenham atendido as tuas vontades,<br />
porque, quando vier a segunda morte, essa não lhes fará mal algum.<br />
<br />
Louvemos, pois, o Senhor e lhe agradeçamos por tudo,<br />
servindo-lhe sempre com grande humildade.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-8005277934506590602011-12-12T10:39:00.000-02:002011-12-12T10:39:57.869-02:00THE BOYS<i>A correria de final de ano, com fechamento de notas e conselhos de classe, etc., me deixa sem o tempo necessário para um novo texto. Recorro (e já tinha de todo modo pensado em fazê-lo em algum momento) ao pequeno poema "The Boys", que escrevi quando meus filhos eram ambos ainda pequenos. Está em inglês, foi assim concebido, mas não é um inglês complicado, de modo que mesmo aqueles de meus leitores que não sejam fortes nessa língua poderão ler e entender os votos de felicidade de um pai coruja para seus filhos amados.<br />
<br />
Aproveito para agradecer as sugestões de nome para o poema da postagem anterior. Decidi ficar com a conscienciosa sugestão da Profa. Mara Jardim, e doravante meu pequeno poema meditativo se chamará "Sine Reditus".<br />
<br />
Grande abraço!</i><br />
<br />
In this house of ours live<br />
two boys. May God always give<br />
both of them light, health and joys.<br />
Nothing bad shall reach the boys.<br />
<br />
And if a monster (a nasty monster!)<br />
tries to get through their bedroom window?<br />
<br />
These two boys aren’t to be fun—<br />
they’ll sure make this monster run!<br />
May God keep them always strong,<br />
away from everything that’s wrong.<br />
<br />
In this house of ours sleep<br />
two boys. May God always keep<br />
both of their lives in good lead,<br />
away from sadness and need.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-30665632335338729622011-11-30T10:23:00.001-02:002011-11-30T11:19:04.802-02:00POEMA EM BUSCA DE NOME, da série "poemas de circunstância"<i>Enquanto aguardamos a continuação do relato sobre Aloprina-Safo (que, afinal, talvez nunca venha, visto tão pouco interesse haver despertado), entretenhamo-nos com mais um "poema de circunstância". Gostaria de lançar um desafio aqui: como nunca soube pôr um nome, um título neste texto, peço àqueles leitores que se sintam inspirados que o batizem. Enviem-me um nome, e aí veremos, certo?<br />
<br />
Abraço!<i></i></i><br />
<br />
Não tens como voltar<br />
Que se saiba<br />
Deixando de lado os embustes<br />
Ninguém jamais voltou<br />
<br />
Ora, o pensamento de que se volta<br />
De que se pode algum dia voltar<br />
Ainda que sob outra pele<br />
E com outros ossos<br />
Atraente embora<br />
Nunca me convenceu<br />
Só os tolos se comprazem a crer<br />
Que valem mais que os pássaros e os cães<br />
Do que as flores do campo<br />
E as taquaras que o vento inclina<br />
<br />
A vida é uma e apenas uma, e só<br />
Teus dias são únicos e teus tão somente<br />
Infinitos talvez psicologicamente<br />
Mas materialmente breves como a aurora<br />
Estão inarredavelmente contados<br />
Eis o que me parece sensato crer<br />
<br />
Mas há um modo de ficar<br />
Se assim o desejares<br />
Na vida dos que permanecem ainda<br />
<br />
Pode parecer estultice<br />
Pensar em deixar algo<br />
Se já nunca mais o veremos em uso<br />
De fato, assim é<br />
Mas que importa?<br />
<br />
Não haverá possivelmente ato de amor maior<br />
Que o desinteresse em deixar-se ficar<br />
Sem que isso nos afete minimamente sequer<br />
E para sempre<br />
<br />
Matar um presidente<br />
Plantar uma roseira<br />
Escrever uma tese<br />
Ainda que insuficiente e cheia de goteiras<br />
Ou alinhar palavras velhas na intenção de um poema novo<br />
Em prosa ou verso<br />
Tu decides, amigo<br />
<br />
Porém o silêncio e o esquecimento talvez<br />
Sejam o que de melhor se possa afinal fazer<br />
E deixar nada no fim<br />
É amar firme e forte<br />
É agradecer o acaso<br />
Que nos pôs nesta inexplicável e maravilhosa<br />
Tristeza de existirPROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-44723203610564173202011-11-21T16:54:00.003-02:002011-11-23T12:06:22.231-02:00ALOPRINA-SAFO (1ª parte)<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">Quando estive na Inglaterra, conheci lá um senhor muito viajado e culto. Como sabemos, são normalmente os ingleses bastante reservados (há mesmo quem os queira até algo fleumáticos), mas, tão logo se façam as devidas apresentações, mostram-se assaz simpáticos e mesmo muito comunicativos. Pois esse senhor de quem vos falo, reconhecendo em mim o indefectível sotaque estrangeiro, quis de imediato saber de onde eu vinha. Informado de minha procedência, revelou-se ainda mais receptivo, pois, disse-me logo, e não sem algum orgulho (quero crer): “Tenho em mim, por parte dos avós maternos, o bom e puro sangue português!” Ora, sendo eu brasileiro, e do tipo “pelo duro”, em quem, caso tivesse o sangue dos distintos povos cor diferente, um corte possivelmente revelasse um líquido policromático, confesso que pouco ou mesmo nenhum sentido pude auferir do qualificativo “puro”, deixe-se de lado “português”; e quanto a “bom”, eis aí talvez um dos vocábulos que, ao lado de “interessante”, tragam em si tanta amplidão de significado que, no final, acabam mesmo por nada significar. Em todo caso, minha imediata observação, visto a pausa de meu interlocutor sugerir-me que algo <i>devesse</i> observar, foi bem esta: “How interesting!”</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">Encontrávamo-nos no <i>backyard </i><span style="font-style: normal;">de uma casa Quaker (numa </span><i>meeting house</i><span style="font-style: normal;">, como lá se lhes chama) e saboreávamos uma boa taça de </span><i>Earl Grey</i><span style="font-style: normal;">, temperado, à moda inglesa, com uma indubitável dosezinha de leite. Tomando ele conhecimento de que eu me ocupasse de ensino, depois de me haver relatado algumas de suas viagens para “além da Taprobana”, entrou aquele Vasco da Gama bretão a falar-me da ilha Aloprina-Safo, que, caso o leitor não saiba (</span><i>eu</i><span style="font-style: normal;"> não sabia), se situa no Oceano Índico, a cerca de 230 milhas náuticas (uns 423km) ao sul das Ilhas Cocos, a oeste da costa ocidental australiana.</span></div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Por curioso e, vamos lá, “interessante”, faço a seguir um breve apanhado do relato que ouvi daquele senhor inglês sobre essa distante ilha e, mais especificamente, de seu singular sistema educacional.</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">A primeira curiosidade daquele lugar que de imediato me despertou a atenção foi, lá, um professor graduado impreterivelmente perceber rendimentos na ordem de 20 a 30 por cento inferiores àqueles auferidos pelos demais profissionais graduados. Não bastasse tamanho dislate, fiquei ainda sabendo que naquelas terras, onde se valoriza em excesso um esporte chamado “tutaopé”, um desportista profissional pode embolsar num único mês o que um mestre-escola talvez não chegue a receber em 20 ou mesmo 30 longos anos de estafante labuta! E isso que tal atleta não necessita saber senão assinar o próprio nome num contrato (e muitos destes, diz-se, saberão pouco mais que isso), ao passo que, por lei, não se pode mais ingressar na carreira docente sem uma graduação superior, uma “licença”, como lá se chama, a qual, somada aos 12 anos do ensino básico, perfará um total de, no mínimo, 16 anos de preparação ao trabalho.</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Tão baixa remuneração não deixou de criar problemas ao governo, que se vê pressionado pela sociedade civil, a queixar-se ou da falta de docentes, ou da pouca qualidade daqueles que se propõem a sê-lo. Pudera, numa sociedade em que o dinheiro representa a mola, o impulso para as ações civis, será um Ghandi, um Cristo ou uma Madre Teresa de Calcutá aquele que, tendo as necessárias e exatas qualificações, se disponha a ingressar em carreira assim tão altruísta; a não ser, claro, que não lhe sobre muito mais a fazer...</div><div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">Tomou o governo federal, então, a iniciativa de estabelecer um “piso” salarial a fim de que, com o tempo, a carreira docente se mostrasse menos antipática. Algumas províncias, porém, depois de um primeiro entendimento da noção de “piso” como se fora quase um “teto” (num equívoco arquitetônico primário, mas não, parece, sem segundas intenções...), recorreram ao Supremo Tribunal Federal, alegando falta de fundos para cumprir a lei. Vendo esse pedido indeferido, seus dignitários entenderam, então, propor aos sindicados docentes que o tal piso fosse sendo alcançado aos poucos, coisa de alguns dois ou três anos, disseram (mas isso sem, no entanto, estabelecerem sequer um calendário em que os professores pudessem objetivamente enxergar seu minguado progresso financeiro). Nada feito, porém! Os sindicatos apresentaram um ultimato: ou se pagava o piso imediatamente, ou a categoria entrava em greve por tempo indeterminado!</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">Ora, um dos artigos da democrática e cidadã constituição de <span style="font-style: normal;">Aloprina-Safo assegura o “direito de greve”. Contudo, em serviços diretos à população (e poucos não o serão), é a greve, como se sabe, uma poderosa carta potencial; mas basta que dela efetivamente se lance mão para que tudo se vá com a breca! A hipocrisia social é tamanha, que, embora consabida seja a penúria do magistério, será sempre uma minoria a estar de fato disposta a pagar o preço da luta, que se quer, no entanto, sempre justa. A imprensa, demagógica por definição (ainda que jure e conjure ser “objetiva”), invariavelmente apresenta uma única e sempre mesma linha editorial: justa embora, não é a greve a melhor saída “no momento”, “é inoportuna”, “e como ficam os cidadãos?”, etc., etc. </span><br />
<br />
<span style="font-style: normal;">Depois, há de se considerar também que, em todo movimento grevista, existem sempre três distintas facções: (1) aqueles que efetivamente entram em greve, o que não significa deixar apenas de dar aulas, mas antes envolver-se numa série de atividades cujo fim último será criar um movimento bem-sucedido; (2) aqueles que não param suas atividades funcionais (seja porque discordam da paralisação: o que os coloca numa posição antidemocrática, visto não ter podido haver a decisão de entrar em greve senão por maioria, nos fóruns adequados; seja porque temem, e isto é sintomático no caso dos docentes, perder suas férias, tendo em vista que deverão, na volta, recuperar o calendário acadêmico, em conformidade com a lei); e (3) aqueles que simplesmente decidem, de modo egoísta, tirar “umas férias” extemporâneas, pensando, cinicamente, que haverá sempre sobra de braços a operar o movimento, e isso quando não argumentam, igualmente de modo antidemocrático, que, porque não concordam com a greve, não veem por que devam trabalhar a seu favor, e acabam assim sem fazer nada (de “férias” mesmo), sendo, depois, os primeiros a choramingar quando se lhes quer obrigar a cumprir o calendário: “E nossas férias!?”, gritam aos quatro ventos. </span> </div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Serão esses os motivos por que as greves dos professores da democrática ilha de Aloprina-Safo se terminam sempre no maior e mais estrondoso fracasso.</span></div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Ao que tudo indica, em Aloprina-Safo os professores, além de pouco dinheiro, têm igualmente bem poucos poderes. Com efeito, um parecer que esses profissionais venham a chancelar não será referendado por esse ato apenas (como o é, por exemplo, um atestado médico ou, a bem dizer, uma disposição de qualquer outro profissional qualificado); tem antes de passar por uma série de mãos, numa escalada hierárquica que, </span><i>mutatis mutandis</i><span style="font-style: normal;">, se assemelhará aos círculos do inferno dantesco. Mas isso, supostamente, se tal parecer vier de encontro ao raciocínio numérico que o governo tenciona apresentar à apreciação da comunidade nacional e internacional. Sendo, portanto, o avanço dos discentes de série para série, ou ano para ano, quase um imperativo categórico, será muito mal vista toda apreciação negativa, que, “unilateralmente” (é o que se diz), queira que um dado aluno deixe de progredir no sistema educacional. Tanto isso é assim, que em algumas comunidades educacionais deverá o docente que queira reprovar um dado aluno munir-se de um verdadeiro dossiê, o qual poderá evidentemente acabar sendo indeferido, juntamente com o parecer negativo que lhe deu origem. Como essas decisões devam ser tomadas em véspera de férias, justamente num momento em que os profissionais estão às portas do anual descanso, serão raros aqueles obstinados que se empenhem a provar ao mundo que uma espada é tão somente uma espada. Assim, o pensamento pragmático do corpo docente é: nossos alunos tiveram a chance de frequentar nossas aulas – ora, se nenhum ou muito pouco proveito puderam colher delas, que assim sigam seu caminho: a vida lhes há de ensinar o que precisam quando (e se) vierem a precisar. E a verdade é que, de fato, dos conteúdos vistos na escola, bem poucos se têm revelado de alguma utilidade efetiva. </span> </div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Há aqui um paradoxo, creio eu, pois, segundo pude entender, valoriza-se um currículo utilitário, que, em outras e mais simples palavras, sirva para alguma coisa na vida do futuro egresso; todavia, esse pobre indivíduo se vê na obrigação de arrebanhar um sem-número de conhecimentos, e todos mais ou menos pela metade, os quais deverá em seguida, e se conseguir livrar-se deles, jogar ao lixo. Mas há, diz-se, uma boa razão para que assim se faça, e esta é um rito de passagem a que, muito apropriadamente, se convencionou chamar “vestibular”. Ora, não havendo vagas para todos na universidade (a constituição de Aloprina-Safo só entende como “obrigatório” o ensino básico), se vê o estudante forçado a disputar um lugar ao sol do saber universitário num concurso muito disputado (o Vestibular). E sairá vitorioso nessa contenda aquele ou aquela que tiver uma memória de elefante, que lhe possibilite lembrar-se de fórmulas, datas, nomes e não sei mais o quê. Mas tão logo entre na universidade, é abrir o latão do lixo e flosh! jogar aquilo tudo às moscas! Será, claro, sempre preciso reservar algo para si, mas aí dá pena de entender que o que se deve reservar foi tão pouco explorado: havia que dividir espaço com o resto.</span></div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Céus! Vejo que avanço já para a terceira página, justamente quando meus leitores me pedem que não escreva muito!</span></div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Façamos assim: como ainda há o que relatar sobre o que me contou aquele senhor inglês sobre a interessante ilha de Aloprina-Safo e seu mui peculiar sistema educacional, fico hoje por aqui para, na semana que vem, voltar a contar-vos mais. Deal?</span></div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Abraço!</span></div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-25625792485289751602011-11-14T18:16:00.000-02:002011-11-14T18:16:22.140-02:00PARA UMA MENINA COM UMA FLOR, ONTEM E HOJE<div style="font-family: inherit;"> </div><div align="RIGHT" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><i>...ler pela primeira vez um grande livro na idade madura </i></span> </div><div align="RIGHT" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><i>é um prazer extraoridinário: diferente (mas não se pode dizer</i></span></div><div align="RIGHT" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><i>maior ou menor) daquele que tivemos ao lê-lo na juventude.</i></span></div><div align="RIGHT" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div align="RIGHT" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><i>Italo Calvino (Porque ler os clássicos)</i></span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;">Já fará dois ou três anos que a Jane, minha sogra, me deu a coleção </span><span style="font-size: x-large;"><i>Vinicius de Moares: obras escolhidas</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, em quatro volumes, publicação de 1983 da Livraria José Olympio Editora (Rio de Janeiro). Tão logo os recebi, usei parte de um dos livros, </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Livro de Sonetos</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, num trabalho que desenvolvia sobre essa forma poemática com uma turma de segundo ano do Ensino Médio. Depois, deixei-os na estante, quietinhos a esperar por mim. Na última sexta-feira, como devesse acompanhar alguns alunos à Feira do Livro de Porto Alegre, meti, já de saída, um dos livrinhos na mochila, sabendo que nas quase duas horas de viagem (entre ida e volta no percurso Charqueadas–Porto Alegre) eu teria de ocupar-me com algo (e sempre gostei de ler em ônibus: fazia-o mesmo quando, na hora do pique, tinha de viajar em pé, nos tempos de estudante em Porto Alegre).</span></span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">Começada a viagem, meti a mão na mochila e puxei o volume estreito, de capa dura e avermelhada. Abri-o e li o título: </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Para uma menina com uma flor</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">. Trata-se, caso o leitor desconheça (e não há, penso, problema algum em desconhecê-lo: tantas coisas desconhecemos), de uma coletânea de crônicas e pequenos contos que o autor escreveu para periódicos como </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Última Hora</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Diário Carioca</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Manchete</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>Fatos e Fotos</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, etc. Está a obra dividida em dois períodos: (i) 1941-1953, e (ii) 1964-1966. Lidos o “Prefácio à 1ª edição” e o poema-dedicatória “A brusca poesia da mulher amada”, decidi pular à página 93 e iniciar a leitura pelo segundo período, justamente a partir da crônica “Para uma menina com uma flor”. Quando chegávamos de volta à escola, eu quase imediatamente concluía a leitura dessas crônicas dos anos 60. No fim de semana, li aquelas do primeiro período.</span></span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Mas por que estou mencionando isso tudo assim com tantos detalhes? Que dirão tais coisas ao paciente leitor que, até o momento, só não interrompeu a leitura porque é pessoa educada e persistente? Pois vejamos se posso interessá-lo.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">Como do Vinicius eu apenas conhecesse o que quase todo mundo conhece, i. é, boa parte do cancioneiro e alguns poucos sonetos: “De repente do riso fez-se o pranto...”</span></span><span style="font-size: x-large;"><i> </i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">(Soneto de separação),</span></span><span style="font-size: x-large;"><i> </i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">ou “De tudo, ao meu amor serei atento...” (Soneto de fidelidade), ou ainda “Oh, partir pela noite enluarada...”</span></span><span style="font-size: x-large;"><i> </i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">(Soneto de Oxford) – abri aquele livrinho de crônicas escolhidas como quem fosse provar um prato, um doce, um sabor novo (sabor esse, é verdade, que de saída, e sem conhecê-lo ainda, já nos dispomos não obstante a apreciar favoravelmente). </span></span> </div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">Contudo, à medida que ia lendo aquela “prosa fiada” (como o mesmo Vinicius se refere a crônica em geral), me dava conta de que já a conhecia, e aí algo maravilhoso, algo sublime e instigante se deu: tive a certeza de que já havia lido aquilo tudo! Conhecerá decerto o leitor a sensação que nos invade quando um aroma esquecido nos remete a uma referência escondida </span></span><span style="font-size: x-large;"><i>in the back of the mind</i></span><span style="font-size: x-large;"><span style="font-style: normal;">, ou quando uma música, ou filme, ou uma paisagem vem evocar em nós a lembrança de algo ou alguém que guardávamos dentro de nós mesmos sem saber que o fazíamos. Pois foi exatamente essa a sensação inefável que me tomou naquele momento, em que eu me reencontrava com um Conrado que pensava já não mais existir, ou, melhor dizendo, que, no estado atual de minhas percepções, nem sequer suspeitava que jamais houvesse existido. Que com o tempo vamos mudando, isso todos bem sabemos; porém, que aquela parte de nós que deixamos para trás cai às vezes no mais completo esquecimento, disso pouco cogitamos. Apenas quando esse “nós”, esse “eu” renasce, é que nos damos conta de que nos havíamos inteiramente esquecido dele.</span></span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Mas que Conrado era esse e quando exatamente ele existiu?</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Quero crer que era um adolescente, aluno do Ensino Médio (ou Segundo Grau, como então se chamava). Já tocava seu violãozinho, e Vinicius de Moraes era uma de suas fortes referências, juntamente com Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Tom Jobim e tantos outros compositores (ou <i>cantautores</i>, como tão bem se diz em espanhol e italiano). É provável que tenha tomado emprestado o livro da biblioteca, se não foi um dos seus amigos, possivelmente o João, que lhe tenha alcançado a obra. Ah, que alegria reencontrar aquela leitura e, através dela, aquele leitor que um dia fui!</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Vejamos se um exemplo pode ajudar a explicar-me melhor. Em “Conto rápido”, a personagem principal, uma sedutora mulher, “apertada num maiô azul”, desmaia na praia ao saber que o mar levara seu filho, e o texto se conclui assim: “afrouxada sobre a areia branca, seu corpo fazia uma graciosa mancha azul”. Esse desfecho, com essas palavras, me pegou de um jeito quando era adolescente, que não pude deixá-lo em paz (ou ele a mim) e, tão logo pude, copiei descaradamente a ideia do poetinha nestes versos que são parte de uma canção que escrevi para a Luciana, uma prima muito querida: “Uma menina, uma cicatriz / Deitada na areia do sonho que fiz”. Não há azul algum aí, é claro, nem a personagem da canção se apresentava como sedutora (era antes uma criança, uma menina). Porém, foram esses versos meus (bons ou maus, não entremos agora no mérito) buscados ali naquele texto do Vinicius de Moraes por um Conrado adolescente e, na época, aspirante a “cantautor”. Ora, e disso me lembrei ali, naquele momento, enquanto o ônibus nos balançava rumo a Porto Alegre.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Outras lembranças tive, associadas àquela leitura, mas sempre coisas assim esparsas, que me vinham de súbito aqui e ali. Ah, a emoção do reencontro, e quando justamente acreditava desconhecer o que me propunha a ler!</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;">Mas, se houve reencontro, houve também descoberta. Era o mesmo livro do Vinicius de Moraes, mas era também um novo livro, pois este leitor, o de quarenta e tantos anos que hoje sou, não somente conhece bem melhor a expressão, mas também boa parte das referências ali feitas, aquilo que chamamos “conhecimento de mundo”, lhe é agora bem mais amplamente acessível.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"> </span><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;">Se, como escreveu Italo Calvino, “um clássico é um livro que não termina nunca de dizer o que tem a dizer-nos”, podemos (ou, pelo menos, </span></span><span lang="pt-BR"><i>eu posso</i></span><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;">) considerar </span></span><span lang="pt-BR"><i>Para uma menina com uma flor</i></span><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;"> uma referência clássica. Saravá, Vinicius!</span></span></span></div><div class="western" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><br />
</span></div><div class="western" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><i>Este texto, porque trata de leitura e leitores, queria humildemente dedicá-lo à grande leitora que foi a vó Albertina. Ela acaba de nos deixar, mas eu vou guardar para sempre, e com muito carinho, a lembrança de nossas conversas sobre livros, autores e mais tantas outras histórias. </i></span></span> </div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-20532938370098537322011-11-07T11:01:00.000-02:002011-11-07T12:49:40.005-02:00MUNDO ESCRITO E MUNDO NÃO ESCRITO (2ª e última parte)<div style="font-family: inherit;"></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Devo recordar as dificuldades específicas que, enquanto italiano, encontro em minhas relações tanto com o mundo quanto com a linguagem, quero dizer, enquanto escritor num país que apresenta contínuas frustrações a quem procure compreendê-lo. A Itália é um país onde se verificam muitas histórias misteriosas, as quais são amplamente discutidas e comentadas diariamente mas a cuja solução não se chega nunca. É um país onde cada acontecimento esconde uma conspiração secreta, que assim secreta permanece, onde nenhuma história chega ao fim porque dela não se sabe o início, ainda que nos deleitem os infinitos detalhes que se acham entre início e fim. A sociedade italiana vive mudanças muito rápidas, mesmo nos costumes, no comportamento: tão rápidas que não chegamos a compreender em que direção nos movemos, e cada fato novo tende a desaparecer, aniquilado pela avalanche de recriminações e por alarmes de degradação e de catástrofe, ou então por declarações que se apoiam em nossa tradicional habilidade de desembaraço e sobrevivência.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Eis por que as histórias que podemos contar se veem marcadas, de um lado, pelo sentido do desconhecido e, de outro, por uma necessidade de construção, de linhas traçadas com exatidão, de harmonia e geometria. É esse o nosso modo de reagir às areias movediças que sentimos debaixo dos pés.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Quanto à linguagem, essa foi atingida por uma espécie de peste. O italiano está se tornando uma língua sempre mais abstrata, artificial, ambígua. As coisas mais simples nunca são ditas diretamente, e os substantivos concretos são sempre usados mais raramente. Essa epidemia atingiu primeiramente os políticos, os burocratas, os intelectuais, e depois se generalizou, estendendo-se a grupos sempre mais amplos no que se refira a uma consciência política e intelectual. A tarefa do escritor é, pois, combater essa peste, fazendo sobreviver uma linguagem direta e concreta. O problema, porém, é que a linguagem cotidiana, que até recentemente era a fonte viva a que podiam sempre recorrer os escritores, essa linguagem hoje não está imune à infecção.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Em suma, creio que os italianos nos encontremos hoje na situação ideal para atrelar nossa atual dificuldade em escrever romances a reflexões gerais sobre a linguagem e o mundo.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Uma importante tendência internacional na cultura de nosso século – a qual poderíamos chamar de “abordagem fenomenológica” em filosofia e de “efeito de estranhamento” em literatura – nos impele a romper essa tela de palavras e conceitos e, assim, a ver o mundo como se este se apresentasse pela primeira vez ao nosso olhar. Mas o que ocorre quando busco esvaziar minha mente e lançar sobre a paisagem um olhar livre de toda referência cultural precedente? Percebo que nossa vida é como que programada para a leitura à medida que fico sempre procurando </span><i>ler</i><span style="font-style: normal;"> a paisagem, o prado, as ondas do mar. Essa programação não quer dizer que nossos olhos se encontrem obrigados a seguir um instintivo movimento horizontal da esquerda para a direita, depois de novo à esquerda um pouco mais abaixo, e assim por diante. (Naturalmente, falo aqui de olhos programados a ler páginas ocidentais; olhos japoneses, por exemplo, usariam um programa vertical.) Ler, mais do que um exercício óptico, é antes um processo que envolve mente e olhos conjuntamente. Trata-se de um processo de abstração ou, melhor, uma extração de concretude a partir de operações abstratas: é o reconhecimento de signos distintivos, o despedaçamento de tudo quanto vemos em elementos mínimos, para a seguir recompô-los em segmentos significativos e, assim, descobrir ao nosso redor regularidades, diferenças, recorrências, singularidades, substituições, redundâncias.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">A comparação entre o mundo e um livro tem já uma longa história, que vem da Idade Média e do Renascimento. Em que linguagem está escrito o livro do mundo? Segundo Galileu, tratar-se-ia da linguagem da matemática e da geometria, uma linguagem de absoluta exatidão. Mas é desse modo que ainda podemos ler o mundo de hoje? Talvez sim, caso se trate do extremamente longínquo: galáxias, quasares, supernovas. Contudo, nosso mundo cotidiano se nos apresenta escrito antes como num mosaico de linguagens, como um muro grafitado, repleto de escritas traçadas umas sobre as outras, uma espécie de palimpsesto cujo pergaminho foi raspado e reescrito muitas vezes, algo como uma colagem de Schwitters, uma estratificação de alfabetos, de citações heterogêneas, de gírias, de ágeis caracteres, como os que aparecem na tela de um computador.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">E pergunto: é uma </span><i>mimese</i><span style="font-style: normal;"> dessa linguagem do mundo que devemos buscar alcançar? Isso fizeram alguns dos mais importantes escritores do nosso século: podemos encontrar exemplos dessa abordagem nos </span><i>Cantos</i><span style="font-style: normal;">, de Erza Pound, ou em Joyce, ou mesmo em alguma vertiginosa página de Gadda, sempre seduzido pela obsessão de unir cada detalhe ao universo inteiro.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Mas será mesmo a <i>mimese</i> o caminho certo? Parti da oposição inconciliável entre mundo escrito e não escrito; ora, se as suas linguagens se fundem, o meu raciocínio cai por terra. O verdadeiro desafio para um escritor é falar do intrincado emaranhado de nossa situação usando uma linguagem que pareça tão transparente a ponto de criar um sentido de alucinação, como conseguiu fazer Kafka.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Talvez a primeira operação para que se renove uma relação entre linguagem e mundo seja a mais simples: fixar a atenção sobre um objeto qualquer, o mais banal e familiar, e então descrevê-lo minuciosamente, como se fosse a coisa mais nova e mais interessante do universo.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Uma das lições que podemos extrair da poesia do nosso século é o investimento de toda a nossa atenção, de todo o nosso amor pelo detalhe em algo que esteja muito distante de qualquer imagem humana: um objeto ou planta ou animal em que se identifique o nosso sentido da realidade, a nossa moral, o nosso eu, como fez William Carlos Williams com um cíclame, ou Marianne Moore com um náutilo, ou ainda Eugenio Montale com uma enguia.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Na França, desde que Francis Ponge começou a escrever poesias em prosa sobre singelos objetos como uma barra de sabão ou um pedaço de carvão, o problema da “coisa em si” continuou a marcar a investigação literária, passando por Sartre e Camus, até alcançar sua expressão máxima na descrição de um quarto de quilo de tomate, realizada por Robbe-Grillet. Mas penso que a última palavra não tenha ainda sido dita. Recentemente, na Alemanha, Peter Handke escreveu um romance baseado inteiramente em paisagens. E mesmo na Itália uma abordagem visual é o elemento comum de alguns dos novos escritores que tenho lido.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">O meu interesse pelas descrições se deveu também ao fato de que meu último livro, </span><i>Palomar</i><span style="font-style: normal;">, contém muitas descrições. Procuro fazer de modo que a descrição se torne narração, ainda que não deixe de ser descrição. Em cada uma dessas minhas breves histórias, um personagem pensa apenas com base naquilo que vê e desconfia de todo pensamento que lhe venha de outros modos. O meu problema ao escrever esse livro foi que nunca tinha sido aquilo que se chamaria um “observador”. Portanto, a primeira operação que tive de fazer foi justamente concentrar minha atenção sobre algo para, em seguida, descrevê-lo ou, melhor dizendo, fazer essas duas coisas </span><i>ao mesmo tempo</i><span style="font-style: normal;">, uma vez que, não sendo eu um observador, se por exemplo vejo uma iguana no zoológico e não escrevo imediatamente tudo o que vi, corro o risco de esquecer-me de como era o bicho.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Devo dizer que a maior parte dos livros que escrevi, assim como a daqueles que tenho em mente escrever, nasce da ideia de que escrever um livro assim me pareça a princípio impossível. Porém, quando estou convencido de que um certo tipo de livro está completamente além das possibilidades de meu temperamento e de minhas capacidades técnicas, é justamente quando me sento à escrivaninha e me ponho a escrevê-lo.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Isso aconteceu com meu romance </span><i>Se uma noite de inverno um viajante</i><span style="font-style: normal;">: comecei imaginando todos os tipos de romance que jamais escreveria. A seguir, tentei escrevê-los, procurando evocar dentro de mim mesmo a energia criativa de dez diferentes romancistas imaginários.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-style: normal;">Um outro livro que estou escrevendo trata dos cinco sentidos. Nele busco demonstrar que o homem contemporâneo não perdeu o uso desses sentidos. O meu problema ao escrever esse livro é que meu olfato não é lá muito desenvolvido, falta-me atenção auditiva, estou longe de ser um </span><i>gourmet</i><span style="font-style: normal;">, minha sensibilidade tátil é bastante imprecisa e, ainda por cima, sou inteiramente míope. Em cada um dos cinco sentidos devo, portanto, fazer um esforço tal, que me permita dominar uma gama de sensações e nuances. Não sei se conseguirei, mas neste caso, como nos outros, meu escopo não é tanto o de fazer um livro quanto o de mudar a mim mesmo, escopo que penso deva ser aquele de toda empresa humana.</span></div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Pode o leitor objetar que prefere os livros que tragam uma experiência verdadeira, obtida integralmente. Pois bem, assim também eu prefiro. Mas, na minha experiência, entendo que o estímulo para escrever está sempre ligado à falta de algo que eu gostaria de conhecer e possuir, algo fugidio, esquivo. E, como conheço bem esse tipo de estímulo, penso poder percebê-lo também nos grandes escritores, cujas vozes parecem alcançar-nos desde o cume de uma experiência absoluta. O que esses autores nos transmitem é o sentido da aproximação da experiência, mais do que o sentido da experiência efetivamente alcançada. O segredo, me parece, é saber conservar intacta a força do desejo.</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;"><br />
</div><div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">Julgo que de certo modo sempre escrevemos sobre algo que não sabemos: escrevemos a fim de que o mundo não escrito possa exprimir-se através de nós. No momento em que minha atenção se desloca da ordem regular das linhas escritas e segue a complexidade móvel que nenhuma frase pode conter ou exaurir, me sinto próximo de entender que do outro lado das palavras existe algo que procura sair do silêncio, algo que busca significar através da linguagem, como se desse golpes numa parede de prisão.</div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-74830611863874484332011-10-31T17:11:00.000-02:002011-11-03T10:31:43.341-02:00MUNDO ESCRITO E MUNDO NÃO ESCRITO (1ª parte)<div style="font-family: inherit;">
</div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i>O texto a seguir, cujo título é o que vai aí acima, é do autor italiano Italo Calvino (1923-1985). É a forma escrita de uma conferência lida pelo autor </i><i>no Institute for the Humanities da </i><i>Universidade de Nova York em 30 de março de 1983. Foi publicado no mesmo ano no "The New York Review of Books" e, em 1985, na revista "Letteratura Internazionale". A versão de que disponho é aquela que se encontra às páginas 114-125 do livro <b>Mondo scritto e mondo non scrito</b> (Milão: Oscar Mondadori, 2002). </i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i><br /></i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i>Os leitores que se interessarem em ter o texto original, sobretudo aqueles que, como Sandra Dall'Onder, Deise Quintana e Raquel Benvenutti (professoras da ACIRS), conhecem muito melhor do que eu a língua italiana, escrevam-me, que o tenho digitalizado. Agradeceria se me apontassem erros, de modo que possa sempre melhorar esta tradução.</i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i><br /></i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i>Publico-o em duas partes, porque há leitores que já me reclamaram da extensão dos textos aqui publicados. (Ah! leitores de pouca fé! Talvez, muito mais provável, de pouco tempo mesmo.)</i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i><br /></i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i>Vamos ao Calvino.</i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i><br /></i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<i> </i></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
Pertenço
àquela parte da humanidade – uma minoria em escala planetária,
mas, creio eu, uma maioria entre o meu público – que passa grande
parte de suas horas de vigília num mundo especial, um mundo feito de
linhas horizontais, no qual as palavras se sucedem uma após a outra,
em que cada frase e cada parágrafo ocupam seu lugar estabelecido: um
mundo que pode ser muito rico, talvez ainda mais rico do que aquele
não escrito, mas que em todo caso requer um ajustamento especial
para que nos situemos em seu interior. Quando me desprendo do mundo
escrito para encontrar meu lugar no outro, naquele que costumamos
chamar de <i>o</i><span style="font-style: normal;"> </span><span style="font-style: normal;">mundo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">feito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">três</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dimensões,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cinco</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sentidos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">povoado</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nossos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">semelhantes,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">isso</span><span style="font-style: normal;">
para mim </span><span style="font-style: normal;">equivale</span><span style="font-style: normal;">
sempre </span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">repetir</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">trauma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nascimento,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">forma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">realidade</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">inteligível</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conjunto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sensações</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">confusas,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escolher</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estratégia</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fazer</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">face</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">inesperado</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ser</span><span style="font-style: normal;">
destruído.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Esse</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">novo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nascimento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">faz</span><span style="font-style: normal;">
sempre </span><span style="font-style: normal;">acompanhar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ritos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">especiais,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ingresso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">numa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vida</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">diversa:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">exemplo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">rito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pôr</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">óculos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vez</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sendo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">míope,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">eles,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">maioria</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">presbita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">rito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">oposto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">impõe,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seja,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">retirar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">óculos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">usam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
a leitura.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Cada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">rito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">corresponde</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mudança</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">atitude</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mental:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quando</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leio,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frase</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">deve</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ser</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">compreendida,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">menos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significado</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">literal,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">devendo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pôr-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">condições</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">formular</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">juízo:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">li</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">verdadeiro</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">falso,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">certo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">errado,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">agradável</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vida</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ordinária,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contrário,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apresentam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">inúmeras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">circunstâncias</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fogem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">meu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entendimento,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">desde</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">gerais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">até</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">banais:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">encontro-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frequência</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">situações</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sobre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">saberia</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pronunciar-me,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sobre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">prefiro</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">suspender</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">julgamento.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Enquanto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">espero</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">esclareça</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">meus</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">olhos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">há</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">página</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alcance</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mão,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">qual</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">voltar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">imergir;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apresso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fazê-lo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">maior</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">satisfação:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nesta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">menos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ainda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">consiga</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">compreender</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">somente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pequena</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">parte</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conjunto,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cultivar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ilusão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ter</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tudo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sob</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">controle.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Creio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">minha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">juventude</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coisas</span><span style="font-style: normal;">
tenham sido </span><span style="font-style: normal;">assim,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">naquela</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">época</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tinha</span><span style="font-style: normal;">
eu </span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ilusão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">iluminassem</span><span style="font-style: normal;">
reciprocamente, </span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">experiências</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vida</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">experiências</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leitura</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fossem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">certo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">modo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">complementares</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">avançado</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">num</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">campo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">correspondesse</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">à</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">outro.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Hoje</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dizer</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conheço</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">já</span><span style="font-style: normal;">
o </span><span style="font-style: normal;">bastante:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">interior</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">livros,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">experiência</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">possível,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alcance</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estende</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">além</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">margem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">branca</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">página.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contrapartida,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sucede</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">circunda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acaba</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">surpreender-me,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">espantar-me,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">desorientar-me. Tenho</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">assistido</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muitas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mudanças</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">minha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vida,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vasto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sociedade,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muitas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mudanças</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">até</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">porém,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">consigo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">prever</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nada,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem</span><span style="font-style: normal;">
no que se refira </span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mim mesmo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem</span><span style="font-style: normal;">
no que diga respeito </span><span style="font-style: normal;">às</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pessoas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conheço,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">menos,</span><span style="font-style: normal;">
quanto </span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">gênero</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">humano.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">saberia</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">prever</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">relações</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">futuras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sexos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">gerações,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">desenvolvimentos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">futuros</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sociedade,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">das</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cidades</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">das</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nações,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tipo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">paz</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">haverá</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tipo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">guerra,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coisa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significará</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dinheiro,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">objetos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cotidiano</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">desaparecerão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">novos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aparecerão,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tipo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">veículos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">maquinário</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">usarão,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">qual</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">será</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">futuro</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mar,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">rios,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">animais,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">das</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">plantas.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Sei</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">bem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">compartilho</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">essa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ignorância</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aqueles</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contrário,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pretendem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">saber:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">economistas,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sociólogos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">políticos;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fato</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">encontrar-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sozinho</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nessa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ignorância</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">serve</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">consolo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">algum.</span><span style="font-style: normal;">
</span>
</div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Pode</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dar-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">algum</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">consolo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pensamento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">literatura</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">compreendeu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alguma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coisa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">outras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">disciplinas,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">isso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">faz</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">recordar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">antigos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">viam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">letras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escola</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sabedoria,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">então</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quanto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">hoje</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">toda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ideia</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sabedoria</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seja</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">inatingível.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Neste</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ponto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leitor</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">perguntará:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dizes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">teu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">verdadeiro</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">página</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrita,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aí</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">te</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sentes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">à</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vontade,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
hás de sair então </span><span style="font-style: normal;">desse</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tens</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aventurar-te</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">neste</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vasto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estás</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">condições</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dominar?</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">A</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">resposta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">simples:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrever.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Porque</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escritor.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">O</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">espera</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">eu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">olhe</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">torno</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">capture</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">rápidas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">imagens</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sucede,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seguida</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">debruçar-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sobre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">minha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrivaninha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">retomar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">trabalho.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">É</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">recolocar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">movimento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">minha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fábrica</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">devo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">extrair</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">novo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">combustível</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">poços</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito.</span><span style="font-style: normal;">
</span>
</div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Mas</span><span style="font-style: normal;">
procur</span><span style="font-style: normal;">emos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ver</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">melhor</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">como</span><span style="font-style: normal;">
andam </span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coisas.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">É</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">assim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ocorre?</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">As</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">principais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">correntes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">filosóficas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">momento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dizem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">disso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">verdadeiro.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">A</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escritor</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
obcecada </span><span style="font-style: normal;">pelas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contrastantes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posições</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">duas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">correntes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">filosóficas.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">A</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">primeira</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">diz</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">existe;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">existe</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">A</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">segunda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">diz</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">comum</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sentido;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">inefável.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">De</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acordo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">primeira,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">espessura</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">eleva</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acima</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">feito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sombra;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acordo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">segunda,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">põe</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">altaneiro,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">como</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">esfinge</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pedra,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sobre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">deserto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">parecem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">à</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">areia</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leva.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">A</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">primeira</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">corrente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estabeleceu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">suas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fontes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">principais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Paris</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">últimos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vinte</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cinco</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">anos;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">segunda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">decorre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">início</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">século,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">partindo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Viena,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e, </span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passando por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">várias</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">transmigrações,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">readquiriu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">atualidade</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">anos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">recentes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Itália.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Ambas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">filosofias</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">têm</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">si</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fortes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">razões.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Ambas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">representam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">desafio</span><span style="font-style: normal;">
a</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escritor:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">primeira</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">exige</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">responda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">si</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesma,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">às</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">suas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leis</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">internas;</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">segunda,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">possa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fazer</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">silêncio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Ambas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">exercem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sobre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fascínio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sua</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">influência.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Isso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acabo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seguindo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">outra,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">crendo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">numa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">na</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">outra.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">creio,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">então?</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Vejamos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">momento</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tirar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alguma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vantagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dessa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">difícil</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">situação.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Antes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tudo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sentimos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">assim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">intensamente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">incompatibilidade</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">porque</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">somos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conscientes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seja</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">podemos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">esquecer-nos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">átimo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">feito</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">usadas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">acordo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">técnicas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estratégias</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">próprias</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conforme</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sistemas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">especiais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">organizam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significados</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">relações</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significados.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Temos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">consciência</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quando</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">história</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">(e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quase</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">todos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">textos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escritos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">história,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ensaio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">filosófico,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">balanço</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sociedade</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">anônima,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">receita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cozinha),</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">essa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">história</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mobilizada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">partir</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mecanismo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">similar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mecanismos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">toda e qualquer</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">história.</span><span style="font-style: normal;">
</span>
</div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Esse</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">grande</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">à</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">frente:</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">hoje</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">temos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">condições</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">evitar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">muitas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">confusões</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguístico</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">assim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">podemos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ver</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">claramente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">relações</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">interpõem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">entre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dois</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundos.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">resta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">senão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fazer</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contraprova</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">verificar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">externo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">está</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sempre</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">lá</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">depende</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">das</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sendo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">antes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">irredutível</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">às</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">havendo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escritura</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">possa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">exauri-lo.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Basta-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">voltar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">costas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">às</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">depositadas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">livros,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">enfiar-me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fora,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">esperando</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alcançar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coração</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">silêncio,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">verdadeiro</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">silêncio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cheio</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">significado...</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">qual</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">caminho</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">alcançá-lo?</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Há</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">quem,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">para</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ter</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contato</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">com</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fora,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">limite</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">comprar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">jornal</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">toda</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">manhã.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Eu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">assim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ingênuo.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Sei</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">jornais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">posso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">extrair</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">leitura</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">feita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">outros,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ou</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">antes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">feita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">por</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">máquina</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">anônima,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">especializada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escolher</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">poeira</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">infinita</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">eventos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aqueles</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">podem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ser</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">selecionados</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">como</span><span style="font-style: normal;">
“</span><span style="font-style: normal;">notícia</span><span style="font-style: normal;">”</span><span style="font-style: normal;">.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Outros,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fim</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fugir</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">do</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrito,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ligam</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">televisão.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">eu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sei</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">todas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">as</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">imagens,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aquelas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">colhidas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ao</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vivo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fazem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">parte</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">discurso</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">construído,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">exatamente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">iguais</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">àquelas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">dos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">jornais.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Portanto,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">comprar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">jornal,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ligar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">televisão,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">me</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">limitarei</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">sair</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">andar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">passear.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">coisa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vejo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ruas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">cidade</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">já</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">seu</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">lugar</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">no</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">contexto</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">da</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">informação</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">homogeneizada.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Esse</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vejo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">aquele</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">reconhece</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">normalmente</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">como</span><span style="font-style: normal;">
</span><i>o</i><span style="font-style: normal;"> </span><span style="font-style: normal;">mundo,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">se</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apresenta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">meus</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">olhos</span><span style="font-style: normal;">
– </span><span style="font-style: normal;">pelo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">menos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">grande</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">parte</span><span style="font-style: normal;">
– </span><span style="font-style: normal;">já</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">conquistado,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">colonizado</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pelas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">palavras, é</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">um</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
traz consigo </span><span style="font-style: normal;">uma</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">pesada</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">crosta</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">discurso.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">fatos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nossa</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vida</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">já</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">classificados,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">julgados,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">comentados, e</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">antes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">ocorram.</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">Vivemos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">num</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mundo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">em</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tudo</span><span style="font-style: normal;">
já </span><span style="font-style: normal;">está</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">lido</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">antes</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mesmo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">venha</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">a</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">existir.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-style: normal;">Não</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">apenas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">tudo</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">o</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">que</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">vemos,</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">mas</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">os</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">nossos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">próprios</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">olhos</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">estão</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">saturados</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">de</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">linguagem</span><span style="font-style: normal;">
</span><span style="font-style: normal;">escrita. O hábito da leitura
transformou ao longo dos séculos o </span><i>homo sapiens</i><span style="font-style: normal;">
em </span><i>homo legens</i><span style="font-style: normal;">, mas
esse </span><i>homo legens</i><span style="font-style: normal;"> não
é necessariamente mais sapiente do que antes. O homem que não lia
sabia ver e ouvir uma quantidade de coisas que nós já não
percebemos: as pegadas do animal que caçava, os sinais da chuva ou
do vento que se aproximava; e ele reconhecia as horas do dia a partir
da sombra de uma árvore e as da noite ao considerar a altura das
estrelas sobre o horizonte. E quanto à audição, o olfato, o
paladar, o tato, a sua superioridade sobre nós não pode ser posta
em dúvida.</span></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
Isso dito, é preciso esclarecer que não venho aqui propor o retorno
ao analfabetismo a fim de que se recupere o saber das tribos
paleolíticas. Lastimo tudo o que possamos haver pedido, mas não me
esqueço jamais de que os ganhos superam as perdas. O que busco
entender é o que podemos fazer hoje.</div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-style: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: right;">
(CONTINUA NA PRÓXIMA SEMANA) </div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-54806079645841771292011-10-23T22:51:00.000-02:002011-11-03T10:32:00.906-02:00CORDEL AOS PROFESSORES<div style="font-family: inherit;">
<b><span style="font-size: x-large;">Escrevi este texto em versos para homenagear os professores do IFSul - Campus Charqueadas, meus colegas, e ele passa a fazer parte, aqui neste espaço, da série POEMAS DE CIRCUNSTÂNCIA.</span></b></div>
<div style="font-family: inherit; text-align: right;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="font-family: inherit; text-align: right;">
<i><span style="font-size: large;">“Como não lecionava para o bem de meus semelhantes, senão apenas em função de minha própria subsistência, </span><span style="font-size: large;">vi completamente malograda minha empresa.”</span><br /><span style="font-size: x-large;"><span style="font-size: large;"><b>David Henry Thoreau</b> (1817-1862),</span></span><br /><span style="font-size: x-large;"><span style="font-size: large;">escritor norte-americano</span></span></i></div>
<div style="font-family: inherit; text-align: right;">
<br /></div>
<div style="font-family: inherit; text-align: right;">
<br /></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Vou cantar à moda
antiga</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Bons colegas
professores</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Toda em rima esta
cantiga</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Com seus sons, talvez
sabores</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Dos cordéis lá do
Nordeste</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Que, nascendo em chão
agreste,</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Vêm deleitar os
doutores</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do Assaré um
“Patativa”</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Inda que sem instrução</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Teve veia criativa</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mostrou gênio e
vocação</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Cabra xucro e sem
dinheiro</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Foi poeta verdadeiro</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Hoje é orgulho da
Nação</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Da escola retirado</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Nem o ano terminou</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Foi buscar seu
“eldorado”</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Não nos versos que
inventou</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mas na roça onde, de
enxada,</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Desde alta madrugada</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">O “pão-nosso” ele
cavou</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mas à noite meditava</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Versos que não soube
ler</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Pois a escrita, coisa
brava,</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Nunca pôde compreender</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">No entanto, meus
amigos, </span>
</div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">À maneira dos antigos</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Na cabeça os fez
nascer</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Sirva este só exemplo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Para os mestres de
lição</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É a escola sempre o
templo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do saber e formação?</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Quantos homens neste
mundo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mostraram valor
profundo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mesmo sem “educação”!</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mas não quero neste
dia</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Desfazer do professor</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Muito menos me valia</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Recusar o seu valor</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">A questão que aqui
coloco</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É mudar antes o foco:</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Não se aprende sem
amor</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Um poeta americano</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Que viveu no novecento</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Escreveu ser mais que
insano</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Tanto esforço, tanto
acento</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">No saber que ao lucro
preste</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Porque o verdadeiro
mestre</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É o que busca o bem
humano</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">E esse bem anda por
onde?</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Meus amigos, lhes
pergunto</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Em que parte ele se
esconde</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Que demora em estar-nos
junto?</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mais vale a mão
estendida</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do que a solidão
erguida</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Sobre o frio e douto
assunto</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Saber algo é preciso</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Disso não há duvidar</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mas o teto sem o piso</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Não flutuará no ar</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">E hoje num mundo em
crise</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É mister que se revise</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">O que temos a ensinar</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">O primeiro mandamento</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É viver bem e à
vontade</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Não deixar que leve o
vento</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">O pilar da igualdade</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Que esta siga
firmemente</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Sempre forte e presente</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Dando base à sociedade</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Numa escola como em
tudo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Nada deve ser assim:</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Manda em cima, embaixo
mudo</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Só a sinalizar “sim”</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Ouvir por vezes um
“não”</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Faz parte da construção</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do melhor e justo fim</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Outro mandamento exato</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">É visar ao integrado</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Pois o homem, eis o
fato,</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Nunca teve só um lado</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Somos muitos num só
dia</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Sempre o mesmo,
todavia:</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Herdeiros do mesmo fado</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">De que vale um
especialista</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Inda assim tão verde a
erva?</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Melhor conhecer a lista</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do que o mundo nos
reserva</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mais vale ensinar o
jeito</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Do que fornecer
conceito</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Que a Ciência não
preserva</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Talvez algo mais
tivesse</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">A dizer-lhes, meus
senhores,</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Mas o muito a gente
esquece</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">E o pouco tem seus
louvores</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">E já dando adeus eu
quero</span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">Deixar inda um mui
sincero</span></div>
<div align="CENTER" class="western" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;">“</span><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><span style="font-weight: normal;">PARABÉNS
AOS PROFESSORES!”</span></span></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="CENTER" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; font-weight: normal; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><br /></span></div>
<div align="RIGHT" class="western" style="font-family: inherit; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;"><span style="font-weight: normal;">(</span></span></span></span><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><i><span style="font-weight: normal;">Prof.</span></i></span></span><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;"><span style="font-weight: normal;">
</span></span></span></span><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><i><span style="font-weight: normal;">Conrado
Abreu Chagas, outubro de 2011</span></i></span></span><span style="font-size: x-large;"><span lang="pt-BR"><span style="font-style: normal;"><span style="font-weight: normal;">)</span></span></span></span></div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-20779789806134125772011-10-18T10:39:00.000-02:002011-10-23T22:40:51.920-02:00A CASA NA BEIRA DA ESTRADA<div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif;">
</div>
<div style="font-family: inherit;">
Sempre que passava por aquela
rodovia, e naquele quilômetro especificamente, Geraldo não podia
deixar de olhar a casa. Ia a Porto Alegre duas, às vezes três vezes
por semana, e sempre ali, naquele trecho, virava a cabeça na direção
da planície para admirar aquela morada cujos proprietários
desconhecia inteiramente. Quis perguntar, mas teve receio de ser mal
interpretado. Que lhe dizia saber quem morava ali ou a quem pertencia
aquilo? Passaria por curioso, no sentido negativo dessa palavra:
alguém cuja inquirição se devia à futilidade tão somente. De
fato, que lhe dizia a ele aquele lugar no meio da planície, a meio
caminho entre Porto Alegre e V*?
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Um dia parou o automóvel. Vinha
sozinho e ainda o sol deixava-se ver por sobre os matos de eucalipto
que lá longe, ao fundo, formavam como que uma cerca àquela paisagem
de calendário: a casa ao centro da pradaria, uma lavoura de arroz a
um lado, vindo até a rodovia, e, do outro, depois de um galpão
alto, cuja frente estava voltada para a casa, um potreiro amplo onde
pastava uma ponta de gado charolês. Bateu uma foto com o celular e
partiu.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Acordou no meio da noite,
transpirando muito. Percebeu que sonhara com a casa. A mulher dormia
profundamente. Levantou-se e foi até a cozinha. Viu que também as
crianças dormiam. Esquentou água para o mate e foi tomá-lo na área
dos fundos. Teve vontade de fumar e lembrou que o colega Almiro lhe
deixara dois cigarros. Foi até a garagem pegá-los no carro. Sempre
queria parar de fumar. A mulher não gostava, nem as crianças, que,
influenciadas por ela, viviam a criticá-lo por isso. Quando um dia
viu o menino pegar um cigarro e, com este apagado, fingir que fumava,
assustou-se. Não queria que o filho viesse a fumar um dia. A mulher
não lhe perdoaria. Má influência.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Abastecido de nicotina, sentiu-se
melhor e voltou a pensar na casa. Teve a lembrança de ter visto
fumaça saindo da chaminé. A cena do pôr do sol, com a fumaça a
sair pela chaminé lhe fazia imaginar que ali naquela casa habitasse
a felicidade. Talvez não houvesse fumaça coisa nenhuma. Afinal,
estavam em maio, e o inverno nem se insinuava ainda. A ideia da
fumaça lhe parecia, porém, ajustar-se àquela paisagem. Quem morava
lá devia ser feliz, pensou infantilmente.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Geraldo não era um homem
infeliz. Ao contrário, não tinha muito do que se queixar. Tinha
saúde, os filhos tinham saúde. A mulher tinha saúde. Não lhes
faltava o principal, pensava sempre.
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
De volta à cozinha, releu pela
décima vez o papel. Que bobagem fizera ao confiar no Eugênio! Teria
agora de entregar a casa. Onde iam morar? E o dinheiro, deste nunca
mais veria a cor! A mulher o chamara de “burro”. A filha ia
dormir sem lhe dar o beijo de boa noite. Só o menino, pequeno, ainda
lhe queria, pensava. O cunhado, aquele pilantra, ria-se dele. “Só
o Geraldo pra fazer uma besteira dessas!”</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Voltou a pensar na casa à beira
da estrada. Procurou inutilmente a foto no celular: decerto a tinha
inadvertidamente deletado. Teve um desejo desvairado de ir até lá,
no meio da noite. Não foi, claro, mas prometeu entrar na estrada de
chão que conduzia até ela na próxima oportunidade.
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Teve de entregar a casa. O
advogado disse que seria difícil reaver o dinheiro, muito difícil.
Mas ia tentar. Geraldo não tinha esperanças. Ninguém tinha. O
cunhado zombava sempre. “Só tu mesmo, Geraldo!”</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Foram morar na casinha de duas
peças nos fundos da casa do cunhado. Ele não queria. “Isso
nunca!” Mas a mulher o fez ver que não havia outra saída, que
deixasse de orgulho bobo. O outro podia até se ofender. Não lhes
estendia a mão? Que deixasse o orgulho vão de lado!</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
O pequeno salário de motorista
da prefeitura de V* era complementado por faxinas irregulares que
fazia a mulher. Esta tinha dificuldades em manter a clientela, pois
faltava muito. Alegava – embora Geraldo não soubesse lhe cobrar
coisa alguma – cansaço e dores na coluna. Ia ao posto de saúde, à
assistência social, vivia a andar de um lado a outro sem encontrar
saída e sem muito trabalho. Não era raro ultimamente chegar ele em
casa e pôr-se a atender aos filhos, que passavam os dias em frente à
tevê. O pequeno não ia ainda à escola, e a menina faltava muito,
tanto que repetia a quarta série pela terceira vez.
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Depois de lavar a louça da
janta, Geraldo saiu até o pátio para fumar. Tão logo acendeu o
cigarro, apareceu o cunhado.
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">E aí,
Gera, botando uma fumacinha nos miolos, hein! Quando é que tu vai
largar essa bosta, hein?” </span>
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Geraldo tinha a impressão de que
todas as frases do cunhado terminavam nesse “hein”.
</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
O outro aproximou-se,
interrompendo-lhe o momento prazeroso.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Tava
querendo falar contigo, Geraldo. Tem um momento?”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Hum hum.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Pois, meu
velho, as coisas andam difíceis.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Nem me
fale!”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Pois é...
Não queria desalojar a mana e as crianças, mas tô precisando
vender esta casa aqui. Acho que vocês vão ter de se ajeitar noutro
lugar, infelizmente.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Tudo bem.
Já estou com um negócio em vista. Ia até te falar.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Ah é? Mas
então fechou certinho.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
“<span lang="pt-BR">Hum hum.”</span></div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Geraldo mentia. Não tinha nada
em vista. A notícia caía como uma bomba. O cunhado não só lhe
estragara o momento prazeroso em que fumava tranquilo depois daquela
louça toda (a mulher estava deitada com dor nas costas, as crianças
vendo tevê), mas também lhe roubava a noite de sono.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
Almiro era quase mudo, e Geraldo
falava pouco. Assim mesmo se entendiam muito bem os dois. Viajavam
juntos às vezes. Almiro achava estranho, embora nada dissesse, que
Geraldo sempre quisesse parar um pouco à beira da estrada toda vez
que iam a Porto Alegre. Parava o carro no acostamento, descia,
acendia um cigarro e ficava olhando a campina. Estaria a par do que
lhe fazia a mulher? Saberia tudo já? Tinha pena de Geraldo. Gostava
dele. Via que procurava andar sempre pelo lado certo, ainda que isso
fosse bem difícil naquela administração cheia de conchavos e
atividades escusas. Nunca lhe ouvira falar mal de ninguém, nem mesmo
do calhorda do Eugênio. Era desatento. Outro em seu lugar já teria
compreendido as indiretas dos colegas no galpão da prefeitura.</div>
<div align="JUSTIFY" class="western" lang="pt-BR" style="font-family: inherit; line-height: 150%; margin-bottom: 0.2cm; text-indent: 2.01cm;">
A notícia veio de modo
desencontrado. Parece que furara um pneu. Ninguém entendia direito o
que se passara. No boletim de ocorrência da Polícia Rodoviária a
descrição do acidente era demasiadamente sucinta. O carro da
prefeitura de V* deixara a estrada principal como se entrasse numa
estrada perpendicular ali no meio daquela lavoura de arroz. A
capotagem foi violenta. O motorista, Geraldo Ferreira dos Santos,
infelizmente contrariando recomendações de serviço, não usava o
cinto de segurança. Morreu antes de chegar ao pronto socorro da
capital.</div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-36467091951643498412011-10-10T11:51:00.000-03:002011-10-23T22:44:10.806-02:00DESTINOS GRANDIOSOS<div style="text-align: left;">
Sempre dei
valor a destinos grandiosos. Na escola, gostava muitíssimo quando me
contavam a história de homens e mulheres que haviam realizado
grandes feitos, fossem eles ou elas cientistas, artistas,
desportistas, líderes políticos ou religiosos. Santos Dumont, Villa
Lobos, Pelé, Tiradentes, São Francisco de Assis, por exemplo, eram
pessoas cujas vidas para mim tinham uma razão efetiva de ser. Não
digo que me desinteressasse o comum dos mortais, mas a verdade é que
vinham as demais pessoas sempre em segundo plano. Assim, quando
projetava meu próprio futuro, é natural que me visse sempre como um
cientista, um artista, um atleta, um mártir político ou um santo.
Não queria saber doutra coisa. Queria era ombrar com os grandes
destinos, igualar-me a eles, ter uma vida que tivesse ao fim valido a
pena.
</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
É preciso
dizer que era um menino passavelmente bem informado; pelo menos para
a época, anos 70, quando, além da escola, pouco havia em que
pudéssemos nos apoiar. Para remediar isso, com paciência e
organização beneditinas, minha mãe foi comprando em fascículos
semanais, até completar e mandar encadernar, a enciclopédia Novo
Conhecer, editada pela Abril. Era costureira, e entre suas freguesas
achavam-se pessoas instruídas, das quais soube a boa mulher tirar
informações valiosas para a educação do filho. Estava ali,
naquela enciclopédia, o meu Google!</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
É bem
provável que por algum tempo eu tenha acreditado que a mesma
percepção de um destino especial e elevado fosse já um indício de
quão especial e particular devesse tornar-se o meu próprio destino.
Vivi, portanto, nessa ilusão alguns bons anos da minha juventude,
até perceber que também meus amigos e colegas tinham lá com eles
ideias ou ideais similares. É de se supor que fantasias assim façam
parte do ideário dos mais jovens, ao menos quando estes tenham
alguma informação, e isso terá possivelmente uma razão de ser.
Não será decerto o adulto de meia idade quem vai encontrar em si o
impulso para grandes feitos e projetos. Este já estará encaixado em
alguma atividade que lhe garanta, ainda que minimamente, a
existência, e ficar saltando de um galho a outro é coisa de
passarinhos e macacos, não de homens! Serão, portanto, os jovens,
salvo as exceções do costume, os acendrados idealizadores de
destinos grandiosos, que como podem vão perseguindo bem ou mal, até
que esses invariavelmente ou não se realizem, ou o façam de modo
muito distinto daquele inicialmente projetado. Terá sido Yourcenar
quem disse fazer todo homem uma grande aposta consigo mesmo, a qual,
no fim, sempre perde.
</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
Ora, quero
crer que a frustração de um grande destino, senão o engodo de se
apostar nele, seja um problema social, especificamente educacional,
de preferência a um qualquer desvio individual ou psíquico. Todo
jovem minimamente informado, todo jovem que, digamos, tenha entrado
na escola terá de dar-se logo conta de que o conhecimento humano se
organiza em áreas como religião (moral), ciência (natural e
humana), arte (onde podemos sempre incluir a literatura), desporto,
etc., a<span style="text-decoration: none;"> chave para entrar nesse
mundo sendo, em primeiro lugar, a linguagem, sobretudo a escrita, e,
modernamente, também um passável domínio dos dispositivos de
circulação da informação (físicos e virtuais). Será preciso que
compreenda que as atividades legais, sobretudo aquelas que dão suporte
ao trabalho real, se baseiam todas naquelas áreas.</span></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<span style="text-decoration: none;">Numa
sociedade sadia, nenhuma atividade, por mais elementar que seja,
devia deixar de perceber-se como integralmente conectada às grandes
realizações do engenho humano. Se o que realizo não tem outra
justificativa que minha única subsistência, como se diferenciará
então o crime do trabalho legal? O que realizo me dá a subsistência
(e não deveria haver a princípio subsistência que não se
fundamentasse no trabalho real), mas essa subsistência será antes
uma consequência necessária de um empreendimento maior e útil à
própria existência humana. Além disso, não havendo vida sem trabalho e sendo a
escola, como se quer, a porta de entrada ao trabalho, é nela que
deveria, portanto, verificar-se a escolha, mas não haverá escolha
alguma sem que se conheçam as opções.</span></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<span style="text-decoration: none;">A
ideia do destino grandioso está intimamente ligada à noção de
gênio. Mas o que será o gênio? Dir-se-á que gênio é quem
apresenta qualidades altíssimas de realização para determina
atividade e o faz “ainda que contra si se verifiquem dificuldades
enormes”, alguém, enfim, que, apesar de tudo, realiza algo à
excelência. Ora, não direi que essa concepção seja inteiramente
falsa, porque sempre, nas atividades humanas, se veem coisas
impressionantes, mas me parece muito mais sensato imaginar o gênio
como alguém que, como se diz, estava na hora certa e no lugar certo,
tendo, evidentemente, as qualidades exatas para o empreendimento.
Mozart teve, parece, um pai obstinado e muito exigente. Poderia haver
enlouquecido ou, no mínimo, comido o velho pão que o diabo sem dó
amassou sem chegar a lugar algum, caso não possuísse as qualidades requeridas para o
empreendimento que se lhe apresentava. Mas que nada! Sua formação e
sua prática, sua vida enfim, tudo lhe serviu para que pudesse
desabrochar seu enorme talento. Steve Jobs, que abandonou o curso
universitário ainda no primeiro ano, acabou percorrendo uma
trajetória que somente depois pôde ele verificar ser a mais
adequada às atividades que veio a desempenhar e as quais tão
brilhantemente realizou. As pessoas têm talentos, tem gostos,
executam certas atividades com prazer e empenho em detrimento de
outras, e quando pode alguém ter a chance de desenvolver aquilo para
que tem qualidades efetivas, verificar-se-ão aí provavelmente as
condições mais favoráveis de emergência daquilo que chamamos
genialidade.</span></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm; text-align: left;">
<span style="text-decoration: none;">O
ideal seria poder a escola formar gênios, não lhes parece? A
impossibilidade de que se realize um plano assim tão ambicioso não se deverá atribuir, é
certo, unicamente à escola, e naquilo que depende exclusivamente dela será preciso que
se considerem mais detidamente os porquês de assim não poder
funcionar essa instituição. Eu diria antes que, melhor do que
formar gênios (se isso for possível), deveria ser sempre função da escola disponibilizar
conhecimentos e meios para que os talentos possam livremente exercer
suas escolhas. A ausência de tais condições, não somente na
escola, mas ainda na família e certamente na sociedade como um todo,
é o que faz com que a juventude siga apostando equivocadamente em destinos
grandiosos.</span></div>PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-73397589122544972122011-09-26T11:04:00.000-03:002011-10-10T13:07:36.858-03:00MACHADO E THERESA CHRISTINA<br />
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
O senhor, a senhora aí
assiste às novelas brasileiras na TV, pelo menos a das nove? A
maioria de nós brasileiros o fazemos, mas de modo algo distinto, e
disso gostaria de tratar hoje.
</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Num grupo de alunos em
curso livre de “Português para Concursos”, comentava
recentemente sobre a reordenação pronominal do português atual, a
que se referem alguns autores como “mistura de pronomes”. O que é
isso? Vejamos dois exemplos.
</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Em comercial não muito
antigo da Caixa Econômica Federal, dizia-se: “Vem pra Caixa você
também. Vem!”. Igualmente, noutro comercial, este do Governo
Federal, lia-se: “Se você não se cuidar, a AIDS vai te pegar”.
</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Em ambos esses
exemplos, temos “a mistura”, como escreveram Faraco e Tezza, de
duas “tribos”: a tribo do “tu” e a tribo do “você”. O
imperativo “vem” pertence à tribo do “tu”. Para aquela de
“você” teríamos “venha”. O resultado, então, seria: “Venha
pra Caixa você também. Venha!”, o que, além de soar estranho a
nossos ouvidos atuais, teria também o inconveniente de deixar de
fora a rima em “em”. No segundo exemplo, “te” não
pertencendo à tribo de “você” deveria ser substituído. Mas
pelo quê? Que tal “Se você não se cuidar, a AIDS vai pegar
você!”, ou “...vai pegá-lo”? Que lhes parece? Nada bom, não
é? Sem contar que, de novo, se perde uma rima em “ar” ou “á”.</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Mas onde entra a novela
nisso tudo? Acontece que o professor aqui falava a seus alunos dessa
característica do português (que, aliás, não é exclusiva do
português, senão de toda língua viva: o inglês por exemplo, além
de perder o antigo pronome singular de segunda pessoa “thou”,
passou a usar o plural de segunda pessoa “you” também para o
singular, de modo que atualmente “you” será “você/tu” ou
“vocês”), e num dado momento chegamos à novela, mais
especificamente aos personagens Teresa Cristina (ou será Theresa
Christina?) e o português dono da lanchonete cujo nome agora me
escapa. Dizia-lhes que a socialaite misturava as tribos “tu” e
“você”, usando “te” e “contigo”, enquanto o português,
seguindo o uso de sua variante, acrescentava às tribos de “você”
e “vocês” o elemento “vosso”, que pertence originariamente à
extinta tribo do “vós”. Mas não criticava esses usos; pelo
contrário, usava a novela como exemplo de como de fato os pronomes
estão se reorganizando em nosso idioma, e que esse fenômeno vinha
se dando na língua portuguesa há já muito tempo.</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Não quero aqui entrar
em mais detalhes sobre o sistema pronominal do português e suas
alterações, passadas e presentes. Baste que o leitor entenda que a
questão do reordenamento pronominal nos conduziu à novela das nove,
onde, porque ali se fala o português atual, vivo e possante,
dispomos de boa fonte de consulta. Mas, quando lhes falava desses
personagens, e vendo que se calavam, quis saber se de fato assistiam
à novela. Nem 10% admitiu que o fizesse. Desconfiei. A maioria
daqueles alunos eram mulheres, e essas geralmente admitem sem
problemas que assistem às telenovelas, ao contrário dos homens,
que, embora o façam, tendem a ser mais relutantes em dizê-lo. Achei
aquilo estranho. Quase todos os alunos eram ou graduados ou já
estudantes universitários, todos a preparar-se para concursos. Que
estaria havendo?</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
A seguir, já não me
recorda por que cargas dágua, veio à baila um conto do Machado de
Assis, “A Cartomante”. Quis saber se já o haviam lido, e agora
talvez 90% afirmou que sim. Perguntei então se “ele” (referia-me
ao personagem principal) morria ou não no final, e ninguém soube me
dizer! Não se lembravam, me disseram alguns. Não se lembravam!</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Estamos assim: quase
ninguém assiste à novela das nove, enquanto quase todos leem
Machado de Assis! Será?</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Aqui chego ao ponto ao
qual queria chegar desde o início: nos envergonhamos das coisas
populares, embora nos agradem, por isso custamos a admitir que as
façamos ou, no caso, a elas assistamos, enquanto, por aquelas coisas
ditas “cultas” ou “cult” (Machado seria “cult”), não
dispensamos grande apreço, ainda que, socialmente, relutemos em
admitir isso, preferindo antes esconder a verdade a fazer papel de
“ignorante”. (Grande coisa ser “ignorante”, desconhecer as
coisas; o pior é não querer conhecê-las -- isso já será
estupidez.)</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Lamento que nosso povo
não conheça autores do calibre de Machado de Assis, Graciliano
Ramos, Fernando Pessoa, e por aí vai. Mas não creio que devamos
fazer cara feia às coisas populares, como certamente o são as
telenovelas. Todos odiavam o sertanejo (“sertanojo”), mas, quando
saiu o filme “Dois filhos de Francisco”, muita gente (inclusive
eu) mudou de ideia. Gilberto Gil, compositor fundamental da
MPB, já disse que o “pagode” é onde o samba permanece vivo e
vendendo, e quantos de nós já não nos orgulhamos do samba, hein? E
assim também o “hip-hop” e o “funk”: se ainda não nos
orgulhamos dessas manifestações dos bairros pobres de nossas
grandes cidades, será sempre preciso respeitá-las.</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Não quero me alongar
muito sobre esse assunto hoje (até porque, infelizmente, não
disponho de muito tempo), mas gostaria de dizer, ainda, que a ideia
de cultura mais atraente será para mim aquela que inclui. Não vejo
choque, contradição ou qualquer outro descompasso entre telenovelas
e Machado. E digo mais: aceitarmos as telenovelas será possivelmente
a condição para que se passe a aceitar Machado, até porque a
aceitação de Machado se tem dado a maior parte do tempo apenas da
boca pra fora, pois quem de fato conhece esse autor? Digo conhece
mesmo, e não apenas leu um ou outro conto, ou um ou outro romance,
que caiam em prova ou no vestibular. Ah, mas a língua é difícil!
Ora, quem diz que Machado é difícil, é empolado, já está a
admitir (olha o portuga aí) que não o conhece.</div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="western" style="margin-bottom: 0cm;">
Enquanto isso, seguimos
assistindo às novelas escondidos...</div>
PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-75602542751137867142011-09-22T11:44:00.000-03:002011-09-22T11:44:51.570-03:00QUANDO A E B SÃO UMA E A MESMA PESSOA
<br />
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
Escrever
deve vir de uma vontade verdadeira de se comunicar com as pessoas.
Não devemos, por isso, escrever por escrever simplesmente, até
porque, com tanta coisa para se ler por aí, não será justo
aumentar indevidamente esse fardo às pessoas, que, embora sempre
possam encontrar algum prazer na leitura, não o terão
necessariamente naquilo que lhes escrevermos, por mais cuidadosa e
conscienciosamente que o façamos, nem deverão, penso, empregar seu
tempo a ler-nos quando o terão muito mais proveitosamente despendido
em outras e melhores leituras.
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
Estaria
aí, em palavras diferentes, uma das máximas de Paul Grice, a de que
não deveríamos falar, ou ocupar os ouvidos, neste caso os olhos,
alheios, a não ser quando aquilo que disséssemos ou escrevêssemos
tivesse de fato relevância. Seja, portanto, relevante!</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
É
claro que o pressuposto aqui é o de que a comunicação seja o
objetivo final da escrita. Talvez seja, mas o será de um modo um
tanto mais complexo do que simplesmente fazer com que uma mensagem
parta de um sujeito A para outro B.
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
Em
primeiro lugar, essa passagem de A a B de um dada mensagem não se dá
intacta. O professor indiano Rajagopalan, num seminário sobre o
famoso livro de John Austin <i>How to do things with words</i>
(“Quando dizer é fazer”, na tradução brasileira), nos dizia
que a linguagem tem essa tarefa intrínseca de transportador, mas
que, ao transportar a mensagem, ela necessariamente deixa que desta
se percam coisas. Seria inevitável. E isso explicaria por que,
apesar de nossos redobrados esforços, nosso interlocutor muitas
vezes não chega a compreender com a exatidão que desejamos aquilo que lhe queríamos dizer. Saem daí, possivelmente, os
mal-entendidos.
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
O
ideal da comunicação, me parece, seria mesmo a telepatia, a
comunicação direta do que nos vai pela cabeça à mente de nosso
“ouvinte”. Já sabemos, contudo, que não há telepatia senão
nos filmes de ficção científica, infelizmente. Depois, a
telepatia, se houvesse, só teria validade para os vivos, ao passo
que grande parte da comunicação relevante para o conhecimento se dá
é com os mortos!</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
Devemos
também considerar nessa relação A e B de interlocução o fato de
B poder ser ontologicamente idêntico a A. Isso se verificará,
senão quando pensamos, certamente quando monologamos. Haverá
decerto uma distinção linguística entre pensamento e monólogo.
Apenas parte do processo de pensar será de fato linguístico,
enquanto o monólogo, esse é <i>inteiramente</i> linguístico,
diferenciando-se, assim, do diálogo tão somente porque, neste, A e
B são dois seres ontologicamente distintos, ao passo que naquele
serão uma e a mesma pessoa. Isso nos leva, portanto, à conclusão
de que, para além de comunicar, terá a escrita uma função "não
comunicativa", uma função que talvez pudéssemos definir como
"organizadora do pensar"; donde se seguirá a estranha afirmação de que o próprio pensamento é
insuficiente à organização racional de nossas mentes.</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="font-style: normal; margin-bottom: 0cm;">
E
este texto que ora se conclui possivelmente não terá sido senão
isto: um monólogo. Ao leitor de decidir se nele encontra-se algo que
para si se aproveite.</div>
PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-60865623719785468412011-09-05T11:12:00.000-03:002011-09-05T14:04:13.149-03:00A César o que é de César? Nada! Power to the players!<i>Semana passada não publiquei texto algum. As razões serão muitas, e pouparei o leitor de elencá-las. Queria, porém, agradecer os e-mails que recebi ao longo da semana perguntando-me pelo texto. Surpreendeu-me muito que uma coluna tão insignificante quanto esta, e com tão pouco tempo de vida, já gozasse de tanto carinho e apreço por parte dos leitores. Mas vamos ao texto desta semana.</i><br />
<br />
<i>Abraço! </i><br />
<br />
Há na escola dois segmentos fundamentais: alunos e professores. E os pais? E os técnico-administrativos? E o pessoal da cozinha e da limpeza? E os “gestores”? E os secretários de educação? E esse e aquele? Todos esses são, evidentemente, muito, muito importantes (ninguém decerto há de duvidar disso), mas <i>fundamentais</i> mesmo, em qualquer escola, serão sempre os alunos e os professores. Não será descabido imaginar uma escola até sem salas de aula, mas nunca, mas <i>jamais</i> podemos concebê-la sem alunos e professores.<br />
<br />
Infelizmente, porém, são justo esses dois segmentos aqueles que menos ouvimos e, portanto, a quem menos poder atribuímos. A política <i>top-down</i> de nosso sistema educacional faz com que tudo já esteja previamente definido quando se põem a trabalhar alunos e professores. Aos primeiros o máximo de escolha que oferecemos é quando lhes mostramos uma série de duas ou três caixinhas, verdadeiros bretes, e lhes dizemos: “Em qual você quer entrar, filho? Boa sorte!” Aos segundos “democraticamente” observamos: “Eis aqui por onde você deve ir, meu caro. Mas lembre-se: você sempre pode escolher entre <i>ir</i> e <i>ir</i>, certo? Boa sorte!”<br />
<br />
Logo se vê que não confiamos nos professores nem queremos de fato, me parece, educar os alunos!<br />
<br />
Não deveríamos, portanto, surpreender-nos quando nos dizem que os “culpados” pela chamada “baixa qualidade” da educação sejam justamente os alunos, que “não estudam por indisciplinados”, e/ou os professores, que “não ensinam por incompetentes”. Se não fossem indisciplinados, os alunos seriam zumbis. Como poderiam nossos jovens não se rebelarem contra um sistema sem liberdade de escolha!? E como poderíamos não nos apresentarmos à sociedade como incompetentes se as decisões que de fato contam não as podemos tomar, nós, os professores!?<br />
<br />
Recordo-me de uma ocorrência que se deu não faz muito tempo numa escola gaúcha (já não me lembro agora se municipal ou estadual, pouco importa). Aconteceu que uma professora teve seu carro arranhado, ao que tudo indica acidentalmente, por duas alunas descuidadas que perto dele andavam de bicicleta. Estas, reconhecendo que deviam prestar contas à professora, vieram falar-lhe, pedindo-lhe que não levasse a coisa ao conhecimento de seus pais. Entendiam possivelmente a gravidade do que haviam feito e talvez temessem o que lhes viria daqueles. A professora, então, decidiu que as meninas, a fim de “pagar” pelo que haviam feito (ainda que provavelmente entendesse que aquilo que haviam feito não tivesse sido intencional), deviam lavar-lhe o carro. No entanto, quando as meninas estavam lavando o carro da professora, a mãe ou a vizinha da mãe de uma delas viu e estranhou aquilo. Foi saber do que se tratava, e o caso foi imediatamente levado à direção da escola, que, possivelmente pressionada pelos pais, não soube talvez tratar do assunto dentro da comunidade, submetendo-o antes à secretaria de educação. Não é impossível que as famílias das alunas envolvidas tenham elas mesmas levado a coisa à secretaria de educação, pois já não me lembro dos detalhes do caso. Seja como for, o ocorrido veio dar na imprensa, e a balança da opinião dos gaúchos pendeu para o lado da família “ultrajada”, contra a professora, que, quase todos diziam, abusara de seu poder. Exigia-se uma reparação! Ora, dizia-se, onde já se viu uma professora beneficiar-se do trabalho gratuito (e ilegal!) de seus alunos menores! Quem, diabos, pensava ela ser!?<br />
<br />
O caso (ainda que não o tenhamos diante dos olhos em todos os seus mínimos detalhes) me parece emblemático e, portanto, pode auxiliar-nos a entender o que vinha dizendo acima. Vamos admitir que essa professora seja não apenas graduada em curso superior competente (com diploma formal e publicamente reconhecido pelo Ministério da Educação), mas também uma pessoa bem-intencionada. Partamos do princípio de que, nada constando em seu desfavor (tanto em seu histórico de vida privada quanto naquele profissional), essa professora seja, portanto, “objetivamente” uma, como se diz, “pessoa de bem” e que a solução que deu ao caso, ainda que aparentemente lhe favorecesse, não o fez ela senão em vista do dano que lhe fora causado. Quero com isso dizer que, se a professora tivesse dado solução idêntica (i. é, que lhe lavassem o carro) em razão, digamos, de as alunas essas não terem feito o tema ou terem brigado ostensivamente com algum colega em sala de aula ou, enfim, de qualquer outro ato que não significasse “prejuízo objetivo” à professora, a solução encontrada podia então levar-nos a desconfiar de sua conduta, a perguntar-nos se não estaria ela se beneficiando indevidamente, se favorecendo, aí sim, do poder, pequeno embora, que tivesse sobre aquelas alunas.<br />
<br />
Até onde pude acompanhar o caso, nada se apurou que viesse desmerecer a reputação da professora. Não obstante, entendeu o poder público (a coisa teria migrado da secretaria de educação para o sistema judiciário) que a professora devia ser punida. Não creio que a tenham exonerado ou lhe imposto algo assim dessa gravidade, mas sempre é o caso que mesmo um simples pedido formal de desculpas à comunidade escolar (e, naquele momento, dada a repercussão da coisa, a toda a sociedade gaúcha) servirá como punição, sobretudo se lá no fundo de si mesma aquela professora não tenha se convencido de que seu ato devesse efetivamente ser considerado indigno.<br />
<br />
É deveras interessante, aliás, observar que a mesma sociedade que não pôde deixar de punir a professora não soube ver um ato legítimo na punição que ela, professora, houve por bem dar a seus alunos! “Punição” essa, assinalemos, que teria partido de um acordo entre professora e alunas. Estaríamos aqui diante de uma situação “dois pesos, duas medidas”?<br />
<br />
É bem provável que o caso, como o apresento ao leitor aqui, não confira, exatamente, com o que de fato se deu na realidade. Passemos por um momento ao largo dos detalhes, que terão decerto sido muitos, e ensaiemos antes considerar a coisa nos termos que acabo de referir acima. Que conclusão se poderia tirar daí? Não sei em que agora esteja o leitor pensando, mas a mim parece óbvio que aí se desrespeitou flagrantemente a autoridade de um professor. Em seu discurso de posse, Dilma Rousseff mostrou-se de acordo com que os professores voltássemos a ser a “verdadeira autoridade” em educação. E tenho certeza de que a Presidente não se referia a autoridade no sentido “autoritário”, ela que já sofreu “na carne” as consequências de um regime que torturava dissidentes. Autoridade aqui se referirá antes à situação em que o professor, dentro da sala de aula, na escola e mesmo na comunidade onde esta se insira, se veria investido do poder de decidir o melhor caminho a seguir. No exemplo acima, a decisão de que as alunas deviam compensar seu ato descuidado com aquela punição jamais deveria ser contrariada por quem se encontrasse fora das circunstâncias, mesmo porque, até onde tenhamos conhecimento do fato, a professora em questão teria, como já dissemos, negociado essa decisão, essa solução, com as próprias alunas. Não se quer afirmar com isso que aos professores se atribuam agora poderes ilimitados e incontroláveis. Nada disso! Sempre se poderá recorrer de uma decisão arbitrária, de algum abuso de poder. Mas o que me parece ser evidente, tanto no caso relatado acima como em muitos outros que constantemente ou lemos na imprensa ou diretamente presenciamos, é partir-se da premissa de que o professor é mal-intencionado, de que sua decisão será sempre abusiva.<br />
<br />
Poderíamos seguir dando exemplos sobre exemplos da existência em nosso imaginário dessa triste premissa. O resultado será sempre um professor de mãos atadas, uma espécie de fantoche controlado por administradores que nem sempre terão, ai de nós! uma concepção verdadeiramente aprofundada do que seja “educar”. E é bom que se repita e se repita sempre: ninguém aqui (eu muito menos do que qualquer outra pessoa, assim espero!) quer que voltemos ao tempo da palmatória, dos castigos físicos. Longe disso! A questão fundamental é esta: qual é hoje o poder de negociação, de decisão, o poder de gerenciamento de que gozam os professores nas escolas brasileiras. O que vemos são seres restringidos a um papel de meros representantes de um sistema burocrático e possivelmente acrítico, sem força alguma nem poder algum de tomar, juntamente com seus alunos e seus pares, decisões efetivamente relevantes sobre as coisas que ocorrem em seu universo específico. E a esses representantes de araque o Ministério da Educação, não obstante, confere um grau, um título. Pergunto: de que valerá efetivamente esse título? Aos advogados não se contesta mais a veracidade de documentos anexados a uma pedição inicial, o que ainda há pouco se fazia; ou seja, a cópia de uma certidão de nascimento, de um comprovante de renda ou de endereço, enfim a cópia reprográfica de todo e qualquer documento que venha ajuntar-se aos autos de um processo judicial, a não ser talvez em casos especiais, não precisa mais passar por um cartório que lhe certifique a autenticidade. Gozam os advogados, portanto, de credibilidade suficiente para que se dispensem tais procedimentos. E mesmo a revista a que se submeterá todo e qualquer visitante a casa prisional, pelas razões consabidas, não a sofrerá um advogado quando for ver seu cliente encarcerado, ainda que hoje se desconfie que alguns desses profissionais têm infelizmente servido ao crime, levando objetos indevidos àquele cliente que decerto lhe terá pago em dobro o “favor”. Também a um médico não se contestará as afirmações que faz num “atestado”. Ainda que ninguém desconheça haver infelizmente “atestados frios”, gozam os médicos de prestígio social suficiente para que os bons, como se diz, não venham a pagar pelos maus!<br />
<br />
Fiquemos nesses dois profissionais e na confiança que se lhes deposita. Comparemos agora essa mesma confiança com aquela em que temos nossos professores! Quem poderá apresentar argumentos que efetivamente justifiquem essa flagrante discriminação entre categorias profissionais, quem??!! E não me venham com isto de que a formação de uns é superior a de outros, que isso tudo não passa de conversa fiada! Profissionais incompetentes existirão por todos os lados! E um grau universitário conferido por órgão governamental competente a alguém que haja devidamente cumprido todas as exigências para recebê-lo não se defenderá abertamente que venha a valer menos que outro, ou sim?<br />
<br />
Agora, vejamos os alunos. É consabido que nossos alunos hoje pouco ou nenhum valor dão a seus professores. Esse papo furado de que “tudo devo a meus mestres” pode até soar bonito num discurso hipócrita de formatura; não será verdadeiro jamais, ainda que aqueles mestres tenham de fato se esforçado para fazer o seu melhor. Entendamo-nos: diante de um professor-títere, que podem os alunos pensar? Eles sabem que as decisões efetivamente relevantes não podem ser tomadas ali, em sala de aula, ou sequer em conselhos de classe. Que autonomia têm nossas escolas para decidir, juntamente com a comunidade, as coisas de efetiva relevância para a educação de seus alunos? O máximo que decidimos é, se tanto, a cor dos móveis ou das paredes das salas de aula!<br />
<br />
Ou alunos e professores passam a poder decidir sobre suas próprias vidas (dentro evidentemente de princípios bem estabelecidos e, havendo necessidade, sob supervisão dos poderes competentes), ou a educação será sempre uma grande farsa!PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-175308451881744222011-08-22T14:45:00.000-03:002011-08-25T20:44:49.501-03:00ESCOLA – UM ESPAÇO INTEGRAL DE APRENDIZAGEM?<i>Este texto foi escrito ao som de “Faraway eyes”, canção do álbum SOME GIRLS (1978), dos Rolling Stones. Dedico-o ao Prof. Antônio por corajosa e generosamente aceitar ser candidato a Diretor do Campus Charqueadas do IFSul.</i><br />
<br />
Uma escola é (ou <i>deveria ser</i>) um espaço integral de aprendizagem, certo? Todavia, o que vemos no mais das vezes é antes uma “cidade fantasma”. Onde estão os alunos quando não é o período de intervalo, o famoso “recreio”? Você olha de fora dos muros lá para dentro e não vê quase ninguém. Você entra na escola, então, e anda pelo pátio e corredores, mas serão poucos os alunos, os professores e demais trabalhadores da educação por ali. Pais, mães, avós, esses muito raramente lá estarão (nem em reuniões destinadas exclusivamente à integração de pais e professores vemos número expressivo de pais na escola). Tampouco na biblioteca (quando esta existe!) você encontrará alguém na maior parte do tempo. E quando aí houver alguém, será o silêncio a imperar. Afinal, na biblioteca, nos dizem sempre, não pode haver barulho! Portanto, sssssssh! Com exceção talvez dos professores e alunos em aula de Educação Física, tão somente um ou outro aluno andará pelo corredor a caminho do banheiro ou atendendo uma incumbência qualquer que lhe tenha dado o professor, mas sempre, claro, sob cerrada supervisão.<br />
<br />
- Que fazes aqui, garoto, que não estás em aula?<br />
- Tô indo no banheiro, 'sora!<br />
- Mostra o cartão de autorização!<br />
- Xi! Misqueci!<br />
- Volta pra aula, JÁ!<br />
<br />
E o rapaz é reconduzido à sala de aula. Mas o que, afinal, é uma sala de aula? <br />
<br />
De todos os espaços da escola (possivelmente com a única exceção do péssimo estado da “quadra de esportes”, quando, de novo, esta existe), é a sala de aula decerto o pior! E, sendo o pior, é não obstante aquele em que se acredita normalmente dever <i>par excellence</i> dar-se o propalado processo de ensino e aprendizagem! <br />
<br />
Quando eu era menino, lá nos anos 70, formávamos fila à moda militar, estendendo o braço à frente e para o lado (só não prestávamos continência...), e a seguir íamos assim em fila rumo à sala de aula. Lá ficávamos até soar a sineta da hora do recreio. Ao término deste, voltávamos a formar fila, agora à frente da porta da sala de aula, e desta só saíamos quando de novo a sineta tocava. Era então hora de ir pra casa, ufa!<br />
<br />
Mas então o mundo era assim, e não havia outro. Pelo menos, eu naquela época não era capaz de conceber que houvesse outro possível. Quarenta anos se passaram, e eu ainda me encontro na escola, agora por opção. E a escola segue “priorizando” a sala de aula! E, estranhamente, segue esse espaço sendo sempre o pior (donde, leitor arguto, as aspas no ambíguo verbo “priorizar”).<br />
<br />
Detenhamo-nos, porém, um momento a considerar as características de nossas salas de aula. São impessoais: não pertencem a ninguém. Talvez uma dada sala “pertença” à turma que ali se encontra naquele turno ou, sendo a escola de dois ou três turnos, às turmas que dividem aquele mesmo espaço ao longo do dia letivo. Será essa sala, ainda assim, sempre impessoal, pois, a não ser por um ou outro trabalho ou cartaz que se lhe afixe às paredes, nenhum dos alunos deixará ali ou, muito menos, terá ali, senão na hora da aula, os seus pertences (o que faz com que deva carregar pesada mochila todos os dias). São frias, senão gélidas, no inverno e horrivelmente quentes no verão, com, quando muito, um ou dois barulhentos ventiladores, se estes funcionarem. As classes e as cadeiras, sobretudo estas, são normalmente muito desconfortáveis. Aliás, não será acaso isso que, a seu modo, queiram nos dizer aqueles alunos que, a despeito do que lhes digamos sobre conservação de “patrimônio” (público ou outro), insistem em riscá-las, nelas colar chicletes mascados, ou eventualmente até quebrá-las? E o que dizer de jovens que, já naturalmente pouco inclinados a estar sentados, devem ainda fazê-lo em móveis tão desconfortáveis!? <br />
<br />
E já que falamos em móveis, vejamos sua disposição. Estive em muitas escolas, em inúmeras salas de aula de diferentes níveis de ensino, e posso dizer que a disposição “olho na nuca” é o infeliz padrão. Não digo que o modelo “auditório” não sirva. Longe disso! Mas serão todas as aulas assim? No Campus Charqueadas do Instituto Federal Sul-Rio-Grandense (IFSul), por exemplo, temos um espaço dito multidisciplinar em que contamos com cerca de cinco mesas redondas para cinco ou seis alunos em cada uma. É notável o interesse que demonstram os alunos em trabalhar ali. Tenho usado bastante essa sala e, quando por uma razão ou outra não o faço, meus alunos reclamam. É evidente sua preferência por aquela disposição. Infelizmente, fora, é claro, os laboratórios (que atendem uma funcionalidade específica), é esse espaço a exceção, sendo as salas de aula do tipo “olho na nuca”, de novo, a triste regra. (Posso ouvir alguém dizendo: “Mas cabe ao professor simplesmente alterar a disposição dos móveis, adaptando-os à finalidade que queira!” Claro, claro. E isso muitas vezes é o que de fato fazemos. Mas ainda assim é a ordenação espacial <i>default</i> um indício bastante eloquente do que se crê deva ocorrer num dado ambiente, ou não?)<br />
<br />
A insistência que vemos em nossos alunos de querer sair da sala de aula a todo momento terá decerto muitas razões, mas uma destas dever-se-á com certeza às características negativas desse espaço apontadas acima. Não creio que numa escola deva ser a sala de aula o único espaço de aprendizagem, mas, se queremos efetivamente priorizá-la, devemos fazê-lo em todos os sentidos dessa palavra, tornando-a um lugar confortável, agradável, um local onde se queira estar e para onde se queira ir, não lhes parece?<br />
<br />
Agora, pensemos no professor. Lá vem ele ou ela feito um homem-aranha trazendo, nas cinco ou seis mãos que terá de ter, e livros, e giz ou canetas-marcadores, e, muitas vezes, <i>CD-player</i>, e mapas, e dicionários, etc., etc. E assim arfando dirige-se a um lugar que não é nem nunca será seu! Ora, se os alunos, que ocupam aquele espaço um turno inteiro, não se sentem “em casa” na “sua” sala de aula, o que dizer do professor, que, como um periquito assoleado, passa o dia a pular de galho em galho? Na verdade, está o homem aí ainda pior do que o bicho, porque este não carrega senão de vez em quando alguns raminhos no bico, enquanto o professor, já dissemos, leva o mundo! Que dificuldade é esta que temos de organizar os espaços, de fazê-los conter em si os apetrechos que diariamente ali devem ser usados, espaços que não se destinam senão àquele fim específico e único, mas que desgraçadamente devem todos os dias ser aparelhados de novo e de novo como uma tela de Penélope que nunca acaba de estar pronta!? <br />
<br />
E é esta sala de aula, senhoras e senhores, precisamente o local em que toda a obra educacional deve verificar-se! <br />
<br />
E lhes pergunto ainda: não haveria na escola outros espaços em que também pudéssemos trabalhar, onde o aprendizado igualmente se verificasse? Já vi, na minha Escola e em outras, excelentes iniciativas, em que professores, por exemplo, levam seus alunos para o pátio, seja à sombra ou ao sol, e ali mesmo, à moda dos sábios educadores de outros tempos, fazem acontecer as suas aulas. Já vi também desenvolverem-se atividades na biblioteca, que por um momento deixa de ser um espaço do silêncio e ganha vida, seja porque alguém lê um texto ou narra uma história, seja porque se entende que circular por seus corredores e estantes, folheando livros e revistas ao acaso, valerá naquele dia específico bem mais que uma preleção sobre não sei que assunto. (Surpreendia-me sempre quando um aluno, já no final do ano letivo, vinha dizer-me que nunca havia posto os pés na biblioteca. Hoje sei mais: entendo que a culpa, se culpa há, será menos deste aluno de pouca iniciativa do que do próprio <i>modus operandi</i> de nossas escolas, com sua atenção quase exclusiva à sala de aula.) E podia seguir nomeando tais iniciativas, que felizmente sempre as há. Contudo, tudo que ocorre fora da sala de aula, se quiser valer "oficialmente" alguma coisa, demandará, no mais das vezes, procedimentos burocráticos que, não digo que não tenham lá sua razão de ser, mas que ao fim e ao cabo desestimulam a iniciativa, favorecendo, isso sim, uma atuação de “professor-relógio-ponto”. Ora, se queremos uma escola de espaço integral, que aguardem os papeis e os formulários! Façamos antes, que haverá sempre tempo, depois, de registrarem-se essas atividades!<br />
<br />
Agrada-me pensar que minha concepção de educação talvez se ajuste àquela que o Prof. Samir tão a propósito refere em seu comentário ao texto da última semana, a saber, a de uma “educação progressista”, que se posiciona como “geradora de inquietação”, como “oposição e resistência a uma ordem relativamente consolidada”. Portanto, se de fato a escola (tanto nosso Campus como qualquer outra escola) quer, já não direi “mudar o mundo”, mas ao menos apresentar-se como uma aliada nessa mudança, deverá antes e sempre transformar-se a si mesma, e será, me parece, a transformação espacial um passo certo nessa direção, quem sabe o primeiro e mais efetivo passo. <br />
<br />
E essa transformação, essa mudança, creio eu, não deve dar-se unicamente na disposição espacial da sala de aula (que, como vimos, requer que seja feita e já!), senão igualmente no rearranjamento, na reacomodação de toda a escola, porque, ainda que reordenemos o espaço interno da sala de aula, é sempre possível que nossos alunos continuem a olhar pela porta aberta e pelas janelas com olhos distantes (<i>faraway eyes</i>).PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-53338867326808757732011-08-15T15:27:00.000-03:002011-08-18T13:33:42.755-03:00A MÁ ESCOLARIDADE SERÁ DE FATO PIOR DO QUE A BAIXA ESCOLARIDADE?Li com muito interesse, no jornal Zero Hora da sexta-feira passada (dia 12 de agosto de 2011), o texto “Baixa escolaridade e má escolaridade”, do “filósofo” e jornalista Eduardo Nunes (o leitor pode também encontrar o artigo nos endereços indicados no final deste texto). De saída, pegou-me a afirmação em destaque: “É fácil saber por que diplomamos, ano após ano, tantos analfabetos funcionais”, mas creio que o teria lido ainda que não trouxesse um destaque tão atrativo, porque venho quase sempre lendo tudo quanto se escreve sobre educação em Zero Hora e no Correio do Povo, jornais que assinamos. Enfim, sempre é o caso que o li, e o fiz com muito interesse.<br />
<br />
Mas por que o interesse? À primeira leitura, me senti tentado a concordar com o autor, que aliás, é bom que se diga sempre, escreve muitíssimo bem. Depois, lendo de novo e de novo e novamente e ainda mais uma vez e outra, notei que aquilo me incomodava sempre. Por quê? Ora, leiamos juntos o parágrafo introdutório:<br />
<br />
“A baixa escolaridade dos aspirantes ao mercado de trabalho é apontada como um entrave ao desenvolvimento do país, mas a falta desses anos a mais de estudo está longe de ser o principal problema a retardar nosso crescimento. Muito pior que a baixa escolaridade é a má escolaridade.”<br />
<br />
Se não sou mais um desses “analfabetos funcionais” de que nos fala Nunes (e espero sinceramente não sê-lo!), devo entender que seria melhor a “baixa escolaridade” do que a “má escolaridade”, certo? (E aqui sempre nos virá à mente aquela famosa asserção atribuída a Albert Einstein de que pouco conhecimento seria uma coisa perigosa.)<br />
<br />
Entenda-se: o conceito de má escolaridade que nos apresenta Nunes não é aquele que pregaria a violência, a discriminação étnica, o fundamentalismo religioso e tantos outros entulhos de tempos idos que desgraçadamente ainda hoje vemos existir. Nada disso! O autor entende por má escolaridade “o gritante despreparo com que as crianças saem dos anos iniciais”. São esses alunos, nos diz ele, “incapazes de entender” o que está escrito nos livros didáticos enviados às escolas pelo MEC. Em Matemática, não conseguem acompanhar os conteúdos próprios da etapa em que se encontram, o que obriga os professores dessa disciplina a voltarem a ensinar-lhes as quatro operações básicas, quando já deveriam andar três anos adiante no conteúdo. Nunes vê nesse atraso a razão da “tragédia dos exames da OAB, em que a imensa maioria dos postulantes, todos bacharéis, é reprovada”. Menciona o saudoso jornalista Fausto Wolff, que, segundo ele, “costumava dizer que devia quase tudo que sabia a suas professoras do primário, com quem aprendeu a ler, escrever e pensar”. Para o autor, é nos primeiros anos de escola que se estabelecem os “alicerces” que “garantem aprendizado efetivo e maduro pelo resto da vida”. E conclui: “Se mal trabalhados [esses alicerces], fazem com que todo o aprendizado posterior seja carente e incompleto.” Portanto, para Nunes, a má escolaridade seria o, digamos, mau serviço em termos de ensino de conteúdos, sobretudo no Ensino Fundamental, quando os alunos “certamente deixaram de aprender muitas coisas que deviam ter aprendido”.<br />
<br />
Todavia, ainda que se aprenda pouco em termos de conteúdo no Ensino Fundamental, não são poucos os estudos a indicar-nos que o aumento nos anos de escolaridade está diretamente associado à melhoria dos padrões de saúde pública (com redução da taxa de infecção pelo vírus HIV, aumento da taxa de vacinação, ganhos acentuados na prevenção e no tratamento de doenças, melhoria nas condições de higiene e em matéria de nutrição, etc.), de demografia (com redução das taxas de mortalidade infantil e de morbidade maternal, aumento da expectativa ou esperança de vida, controle da natalidade, com redução da gravidez indesejada, etc.) e de economia (com o aumento da produtividade das sociedades aumenta-se por conseguinte o poder aquisitivo, etc.), para não mencionarmos aqui senão três áreas importantes. <br />
<br />
Igualmente, do ponto de vista político-social, não será decerto irrelevante o fato de que, ao aumento do tempo de escolarização, possamos associar, nas sociedades modernas, a capacidade de uma melhor compreensão dos mecanismos de resolução não violenta de conflitos, a autoconfiança do cidadão, um melhor entendimento das diferenças entre grupos sociais distintos, entre outros benefícios, e tudo isso, é claro, sendo a resultante de mais acesso à informação, que em muitas comunidades (inclusive brasileiras) só se verificará <i>na escola</i>. Não será por outra razão, aliás, que na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989) figura a educação como um dos direitos inalienáveis da criança (que, naquele documento, conforme Art. 1º, é “todo ser humano menor de 18 anos”).<br />
<br />
Não quero discordar de Nunes quanto à baixa qualidade em termos de conteúdos da educação brasileira contemporânea. Venho lecionando há já tempo suficiente para conhecer nossas escolas (públicas e privadas). Mas esse trololó de que no passado as coisas eram melhores não me convence. E não precisarei buscar pelo Google estatísticas e outros dados para afirmar que, a não ser pelos beneficiados de então, ninguém seriamente trocaria a situação educacional brasileira de hoje por aquela que tínhamos há 40 anos. É claro que os alunos do Ensino Médio do Colégio Pedro II, naquele famoso curso de bacharelado que lá havia, acompanhavam sem grandes problemas os exemplos de Ciro dos Anjos, Eça de Queirós, Machado de Assis, José de Alencar, Clarice Lispector, etc. que Othon Garcia lhes apresentava em aula a fim de ilustrar os “tipos de discurso”, coisa que alunos meus, formandos do curso de Direito de distinta universidade gaúcha, não puderam fazer, forçando-me a usar material “mais acessível” em lugar dos excelentes capítulos III e IV do <i>Comunicação em prosa moderna</i>. Mas, que diabos, homem! Dos 511 anos de história do nosso país, 322 (63%) vivemos sob a condição de colônia, e faz somente 40 (de 1971 para cá) que nosso Ensino Fundamental é obrigatório, período que não ultrapassará (se tampouco sou analfabeto funcional em matemática, bem entendido!) 8% do total de nossa existência aqui neste Novo Mundo! Portanto, garantir a escola para todos, ainda que a escolaridade não seja (ainda) boa, a meu ver será sempre melhor do que não ver essa gente toda frequentando a escola, sobretudo se a má escolaridade não tem, como me parece que não tenha, a orientação do entulho referido acima, tratando-se ao contrário de algo que boas políticas públicas na área podem, num futuro não muito distante (espera-se), vir a tornar “bom”.<br />
<br />
Agora, que nós professores sejamos no geral mal preparados, isso ninguém ignora. Mas o Nunes, que, parece, já não leciona mais, mete o dedão na ferida e nos coloca em duas categorias: os incompetentes e os mal-intencionados. Os primeiros porque não sabem ensinar, ponto, e os segundos porque, como diz, “ensinam mal por opção”. Estes não deixam igualmente de ser incompetentes, visto, segundo Nunes, implementarem mal as teorias pedagógicas nas escolas, ao passo que aqueles poderiam até ser considerados um tanto mal-intencionados também, uma vez que adotam a carreira do magistério porque “não conseguem colocação melhor”. É triste! No entanto, nestes meus vários anos de magistério, quanta gente eu vi que não era uma coisa nem outra. Gente equilibrada e extremamente bem-intencionada, que busca incansavelmente qualificar a si e a seus alunos, que compreende que na vida o vestibular não é tudo – mais: que é o vestibular uma aberração de um sistema educacional elitista, que só premia aqueles que largam quadras e quadras na frente. Ora, e se não for pelo vestibular, muito conteúdo considerado “importante” perde ligeirito seu <i>status quo</i>, ou o leitor aí que não atua na área de Física ou Química ainda se lembrará em detalhes das leis de Newton ou da numeração dos gases nobres? E menciono essas duas disciplinas aqui ao léu, que em todas haverá coisas de que nos esquecemos tão logo delas deixamos de ter necessidade, e o fazemos muito bem, penso eu!<br />
<br />
Por fim, não penso em defender aqui as políticas públicas que hoje temos para a educação, as quais nosso inconformado Nunes não deixa, é claro, de também criticar, ainda que o faça meio <i>en passant</i> (não fala diretamente, por exemplo, como me parece que devia no espaço que ocupou, que estamos longe de investir os 10% do nosso PIB na educação brasileira, como aliás quer o Texto Constitucional). Apenas direi que essas políticas nem sempre estão equivocadas. Um dado interessante: dos 61 países que vêm medindo sua “qualidade de ensino” através das orientações do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA, na sigla em inglês), o Brasil ocupa a 49ª posição em Leitura e Ciências, e a 53ª em Matemática, enquanto o Japão se encontra na 7ª posição em Leitura e Matemática, e na 5ª em Ciências (dados de 2009). Contudo, no Japão não há reprovação ao passo que o Brasil, apesar de dizermos que aqui os alunos avançam a torto e a direito, é o terceiro colocado em termos de reprovação. Detalhe: já se constatou (e os dados no site da OCDE, organização que coordena o PISA, são bastante eloquentes) que os países que mais reprovam são justamente aqueles que se encontram mais abaixo na classificação.<br />
<br />
Haverá decerto outras variáveis aí, não lhe parece, amigo leitor? Em todo caso, questões educacionais são sempre bastante complexas, e o texto do Nunes, ainda que bem escrito e aparentemente óbvio, revela-nos no entanto que o autor, assim como aqueles professores e alunos que ele critica, precisa sempre estudar mais. <br />
<br />
<i>Aqui estão os endereços onde o leitor pode encontrar o artigo do Eduardo Nunes:</i><br />
<br />
http://www.todospelaeducacao.org.br/comunicacao-e-midia/educacao-na-midia/18090/opiniao-baixa-escolaridade-e-ma-escolaridade-por-eduardo-nunes/<br />
<br />
http://eduardonunes.org/escola/baixa-escolaridade-x-ma-escolaridade/PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com21tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-6177554583919109112011-08-08T10:09:00.000-03:002011-11-04T08:58:12.153-02:00Ensinar de verdade? Quem sabe então: "educar de verdade"?<i>Amigos leitores:<br />
<br />
Este bogue não tem como tema exclusivo a linguagem, embora, dada a formação de seu autor, será possivelmente esse um dos assuntos mais recorrentes. <br />
<br />
O leitor Roberto Silva Kun publicou aqui um comentário muito instigante referente ao texto da semana passada,“Língua difícil? – uma reflexão sobre a língua portuguesa e o uso que dela temos feito”, e muito provavelmente tendo também em mente o texto da semana anterior, “Por uma vida melhor”, no qual defendo o livro <b>Por uma vida melhor</b>, distribuído pelo PNLD, que vem injustificadamente, a meu ver, sendo atacado. <br />
<br />
De pronto, como é meu costume, redigi uma resposta a suas observações. Contudo, como tal resposta se mostrasse demasiado extensa, decidi publicá-la como o texto desta semana. Deixei lá, como resposta imediata ao Roberto, apenas breve nota informando-o de que procederia assim. <br />
<br />
Eis a seguir, portanto, minha resposta ao Roberto. Não republico aqui seu texto, deixando ao leitor interessado o cuidado (possivelmente recomendável) de lê-lo lá onde se encontra, i. é, entre os comentários ao texto da semana passada.</i><br />
<br />
Roberto:<br />
<br />
Primeiramente, quero te agradecer a leitura e, claro, o comentário. É evidente que quem escreve quer ser lido, mas, no caso de um blogue, para além da simples leitura, existe essa fantástica possibilidade de comentar o que se lê, de interagir com o autor, que pode (como tenho procurado fazer) responder a seus leitores (que, neste momento, assumem já a condição de autores). Meu blogue não tem ainda dois meses de vida, e eu já estou fascinado por essa oportunidade de não apenas divulgar por escrito o que leio e penso, como também dialogar com meus leitores.<br />
<br />
Penso poder entender tua preocupação com os destinos do nosso idioma. Não penses tu que também eu não me preocupe com isso. O simples fato de em duas postagens seguidas eu me haver ocupado dessa temática é, no meu entender, já revelador dessa preocupação. <br />
<br />
Teu texto me interessou muito. Procurei, depois de várias leituras, dividi-lo em tópicos e ir buscando responder a cada um deles. Isso talvez alongue esta minha resposta. Que fazer? Assim parecem funcionar as coisas. Peço, portanto, paciência a ti e aos demais leitores, que todos, espero, só faremos desenvolver, como dizes, “um maior e melhor conhecimento” senão de nosso idioma, ao menos de algumas questões a ele pertinentes.<br />
<br />
1. “...fico com a impressão de que você não tem interesse em contribuir com a manutenção do idioma”<br />
<br />
Tudo depende, Roberto, do que tu entendas por “manutenção”. Tenho todo o interesse de que as pessoas, sobretudo aquelas que estudam português sob minha orientação, não apenas conheçam “mais e melhor” essa língua, mas também aprendam a amá-la tanto quando eu. Ora, amigo, se tu amas algo ou alguém, terás decerto todo o interesse em <b>não</b> deixar de estender-lhe teu suporte, palavra que penso não me equivocar em ver como parte integrante do conceito de “manter”. Fico pensando cá comigo que trecho ou trechos de meu texto ou textos te levou a essa impressão. Quando escrevemos ou falamos iludimo-nos de que aquilo que lá na cabeça tínhamos na origem se revelará tal e qual ao nosso leitor ou ouvinte. Todavia, as coisas não são bem assim, infelizmente. Devo numa passagem ou outra ter me equivocado. Seria demais te pedir que me indicasses tais trechos?<br />
<br />
2. “...agora por todos os lados se vê um esforço contrário, tentando enfraquecer a noção de certo e errado, norma culta, regras, etc.”<br />
<br />
De fato, Roberto, existe tal esforço. Mas isso pode não ser necessariamente algo ruim. “Certo”, “errado”, “norma culta” e mesmo “regras”, tudo isso são conceitos que estão sendo investigados. Já sabemos, por exemplo, que “certo” e “errado” são classificações relativas. Assim, diremos que tal construção está “certa” ou “errada” consoante o contexto em que se veja inserida. Tu não dirás, por exemplo, que “Tu foi no cinema ontem?” é uma frase “errada” quando dita por um porto-alegrense a outro numa situação informal ou semi-informal, ainda que possivelmente essa sentença deva, em situação idêntica, muito bem ser assim classificada se um lisboeta a tiver usado. (Não sou um especialista em português europeu, mas suponho que nessa variante os verbos ainda mantenham, mesmo em situações informais, a antiga conjugação de segunda pessoa do singular. Talvez me engane.) <br />
<br />
A denominação “norma culta”, por sua vez, me soa algo equivocada; pelo menos, um tanto infeliz, já que nos leva a supor que as demais normas sejam desprovidas de cultura, suposição essa demasiado temerária, me parece, pois lança mão, para sustentar-se, de um conceito bastante estreito de cultura. <br />
<br />
Quanto a “regras”, é sempre bom ter algum cuidado, porque na gramática “prescritiva” tradicional contam-se a mãos-cheias regras cuja motivação ou é um simples capricho do compilador, ou se baseia num <i>corpus</i> eminentemente literário, bem distante, portanto, do que se verifica tanto na fala quanto na escrita hodierna. Não que não se devam escrever gramáticas que nos auxiliem a ler autores do passado. Nada disso! O que não se pode querer é que gramáticas baseadas apenas em autores clássicos de nossa literatura venham a apresentar-se como “o” modelo para o uso atual. Não é preciso ser um Darwin para entender que as línguas, sendo organismos vivos, se alteram com o passar do tempo. Não fosse isso, ainda diríamos “magistra discipulum amat”, ou algo parecido, em lugar de “a professora gosta do aluno”.<br />
<br />
3. “O enriquecimento de nosso idioma está ameaçado, corremos o risco de retroceder.”<br />
<br />
Não posso concordar com isso, Roberto! Em língua, não creio que haja passo para trás, ou pelo menos não enquanto houver falantes/usuários dela. Se não investirmos em boa educação, em leitura, se não alcançarmos poder, responsabilidade e condições dignas às camadas mais desfavorecidas de nossa população, decerto andaremos para trás. Contudo, ainda que isso venha a acontecer, nossa língua seguirá seu caminho incólume. Incólume, digo, mas não inalterada. <br />
<br />
Há quem morra de medo de que o português empobreça morfologicamente. Não creio conhecer língua que tenha sido mais alterada morfologicamente do que o inglês depois da “invasão” normanda. Ninguém dirá hoje, contudo, que, pobre morfologicamente embora, não seja o inglês uma das línguas mais eficientes e bem-sucedidas no Ocidente. “Ah, mas isso se deve ao Império Britânico, ao imperialismo americano, etc...”, dirá alguém. Pois justamente! Da língua em si dificilmente diremos sem preconceito ser ela “pobre” ou “rica”, ou “feia” ou “bonita, ou então “isso” ou “aquilo”: a língua será sempre aquilo que o povo que a usa será. Portanto, demos corda, por assim dizer, ao brasileiro e deixemos nosso português seguir seu próprio caminho!<br />
<br />
4. “É uma pena, porém, que aqueles que deveriam lutar para proteger os avanços históricos e ampliá-los tornem-se cúmplices do empobrecimento da língua.”<br />
<br />
Se me incluis entre “aqueles que deveriam lutar” etc., como me parece que fazes, não deixo de ficar lisonjeado. Recebo de ti como que o reconhecimento de encontrar-me numa posição de algum poder. Possivelmente, enquanto professor de língua portuguesa, de fato eu goze de algum “poderzinho” nesse sentido. Contudo, não vejo minha atuação como aquela de um agente, ainda que secundário (“cúmplice”), do “empobrecimento da língua”. Não vejo, e aí, me parece, discordamos efetivamente, não vejo, digo, a nossa língua num processo de empobrecimento. Há sem dúvida transformações, mas essas não significam necessariamente empobrecimento. <br />
<br />
Poderá alguém pensar que, por usarmos hoje uma conjugação com menos concordâncias do que faziam nossos antepassados (e será que todos as faziam?), estaríamos de alguma forma “empobrecendo” nossa língua. Assim, em lugar de “eu canto, tu cantas, ele canta, nós cantamos, vós cantais e eles cantam”, temos hoje “eu canto, tu canta, ele canta, a gente canta, vocês cantam, eles cantam”, ou seja, em lugar de seis formas distintas para o verbo, temos hoje frequentemente apenas três. Há quem decerto pense que isso seja empobrecimento. De fato, morfologicamente essa alteração pode ser assim chamada. Mas isso não significa “empobrecimento” no sentido de algo contra que devamos lutar, pois a riqueza em termos semânticos e também sintáticos dessas formas pode muito bem manter-se inalterada. O inglês conta com apenas duas formas para o verbo no presente do indicativo e o francês três. E falo aqui do inglês e do francês “cultos”. Ora, diremos que essas são línguas pobres!? Dificilmente.<br />
<br />
Também quanto à concordância nominal, se compararmos nossa língua com o francês e o inglês “cultos”, veremos que nestas ou de regra apenas o primeiro elemento do sintagma nominal se altera, ou apenas o substantivo se altera. No primeiro caso, encontra-se o francês, em que o plural de, por exemplo, “le garçon brésilien” será “les garçons brésiliens”. Aqui, embora se verifique um “s” de plural em “garçon” e “brésilien”, tais palavras são de fato pronunciadas como se não o tivessem, ou seja, são pronunciadas exatamente como o são no singular. Apenas o artigo “les” indicará o plural de todo o sintagma e ainda assim não em razão do “s”, que, neste caso, não é pronunciado, e sim pela qualidade da vogal, i. é, o “e” de “le” é fonologicamente distinto do “e” de “les” (o que, diga-se incidentalmente, nos mostra a diferença entre fala e escrita também no francês). Aliás, é esse fenômeno exatamente aquele que observam os autores do livro <i>Por uma vida melhor</i> estar se verificando no português. Observação, diga-se a verdade, que não vem deles, que são autores de livros didáticos, mas de pesquisas feitas em programas de pós-graduação de universidades muito bem conceituadas. <br />
<br />
No segundo caso, temos exemplos bem conhecidos do inglês em sintagmas como “the Brazilian boy”, cujo plural será “the Brazilian boys”. Observe-se que o único elemento a pluralizar-se morfologicamente é “boy”. Assim, quando alguém se assusta com os rumos da língua portuguesa quando ouve dizerem coisas como “as cadeira amarela”, e o faz porque imagina haver um empobrecimento talvez de ordem “cognitiva” em questão, julgo que falta a essa pessoa deter-se um pouco mais a considerar os fenômenos linguísticos, e nesse sentido o estudo de outras línguas pode nos trazer muitos esclarecimentos sobre nossa própria língua.<br />
<br />
Mas, voltando aos exemplos dados acima, diremos nós que o francês e o inglês são línguas pobres? Que sua morfologia tenha se empobrecido ao longo do tempo, isso não há como negar. Porém, tal empobrecimento não significou de modo algum depauperação, involução ou perecimento; antes pelo contrário!<br />
<br />
Compreender essas mudanças em nossa e em outras línguas, ver em que medida se vêm realizando efetivamente no uso “real” (tanto escrito quanto falado) que de nosso português fazemos, discutir essas questões em sala de aula, instigar os alunos a que pesquisem sobre o idioma que usamos, nada disso me parecem atividades de um “cúmplice do empobrecimento da língua”. Talvez até não me opusesse a que dissessem que, ao contrário, ando a “proteger os avanços históricos” de nosso idioma.<br />
<br />
5. “Creio que o uso da nossa língua seria qualificado por meio de um maior e melhor conhecimento do mesmo, a fim de que todos possam dominá-lo bem, ao invés de se estabelecer a média de conhecimento como normal.” <br />
<br />
Não vejo minha atuação nem, muito menos, aquela dos autores do livro <i>Por uma vida melhor</i> como “estabelecendo a média de conhecimento como normal”. Ao menos assim me pareceu depois de ler o capítulo 1 daquela obra. E justamente o que se vem procurando fazer é promover “um maior e melhor conhecimento” de nossa língua, ampliando os horizontes de nosso entendimento sobre ela, que não deverá se restringir à memorização de regra em cima de regra, numa ânsia desmedida de garantir o acesso a uma “norma culta” que, segundo se tem investigado, nem os ditos “cultos” eles mesmos parecem dominar.<br />
<br />
6. “É necessário levar as pessoas ao conhecimento, ao invés de aceitar que não consigam obtê-lo.”<br />
<br />
Isso já está, me parece, respondido acima. Ainda penso, se posso acrescentar algo à resposta, que o melhor método é ir do conhecido ao desconhecido. Assim, procederemos no estudo do idioma respeitando o conhecimento dele que trazem para a sala de aula nossos alunos. Não caberá entrar com Vieira e seus latinismos num grupo em que o contato com a língua escrita seja ainda bastante incipiente. Isso não quer dizer, porém, que não se chegue um dia ao genial padre barroco, havendo sempre, é claro, tempo e sobretudo interesse.<br />
<br />
7. “Em outras palavras, ensinar de verdade, e não simplesmente dizer às pessoas que podem ficar como estão, sem muito entendimento.”<br />
<br />
“Ensinar de verdade”! Que coisa! Poderia responder a esse comentário de muitos modos, mas aqui apenas referirei uma sugestão que li já nem me lembro em que autor, a de que passemos a usar “educar” em lugar de “ensinar”, e isso porque “ensinar” (do latim <i>in + signare</i>) é pôr algo (um “signo”) para dentro supostamente da mente do aprendiz, enquanto “educar” (latim <i>e(x) + ducere</i>) é conduzir algo para fora, supostamente também da mente do aprendiz. <br />
<br />
Teríamos aí, portanto, duas concepções distintas de educação: na primeira (a de “ensinar”) quer meter-se algo na cabeça dos outros; na segunda (a de “educar”) busca-se, à moda socrática, auxiliar o outro a que veja por si mesmo o que o cerca, busca-se, portanto, como que extrair o conhecimento que lá no fundo, em nós mesmos, podemos encontrar. <br />
<br />
É claro que há coisas de que nada ou muito pouco sabemos, e essas nos devam ser apresentadas possivelmente a partir do zero, senão quase a partir deste ponto. Nem todo conhecimento se dará pelo método da maiêutica, como queria Platão. Todavia, no caso específico de nossa língua-mãe, os alunos já a conhecem muitíssimo bem, pois dela vêm se servindo desde seus primeiros balbucios. Não se pode jogar fora toda essa experiência linguística e partir do nada, nem jamais se deverá dizer a alguém que a língua que traz de casa deva ser abandonada. Que o leitor considere a contribuição linguística que se encontra na obra de um Simões Lopes Neto, de um Guimarães Rosa, para mencionar apenas dois de nossos grandes e consagrados autores, e me diga se não é a língua do povo de uma riqueza inestimável!<br />
<br />
Quem sabe isso não seja de fato “ensinar de verdade”. Pouco importa! Talvez devamos antes começar a “educar de verdade”.<br />
<br />
Grande abraço!<br />
<br />
ConradoPROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-55398157191219833202011-07-31T18:32:00.000-03:002011-07-31T19:01:41.787-03:00LÍNGUA DIFÍCIL? -- UMA REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA PORTUGUESA E O USO QUE DELA TEMOS FEITO<i>O texto a seguir foi utilizado especificamente em sala de aula, com duas turmas minhas de Português. Buscava algo sobre o assunto e acabei escrevendo o texto que queria. Não o dei a conhecer em meu nome, porém. Para evitar impor minha opinião aos alunos, achei melhor valer-me de um pseudônimo, um certo Sebastião de tal. Que meus alunos me perdoem o truque, até porque não julgo que as aulas em que o trabalhamos tenham sido das piores. <br />
<br />
Publico-o agora aqui no blogue porque, primeiro, me parece um bom texto em si mesmo, depois, não deixa de relacionar-se com aquele aqui publicado na semana passada. Ao leitor de considerar as contradições e acertos.<br />
<br />
Abraço,<br />
<br />
Conrado<br />
<br />
PS Não teria sido César (como está escrito no cabeçalho do blogue), mas seu sobrinho Otávio Augusto quem mantinha em cerimônias públicas um escravo a recitar-lhe ritualmente "Cave ne cadas; memento mori" (=Cuidado para não caíres; lembra-te de que deves morrer). Pelo menos essa é a informação colhida na revista <b>Ça m'intéresse</b> (núm. 6, junho de 2011), que o Gugu tão gentilmente me trouxe da França. Ah, sim, e "Que sais-je?" se traduz por "O que sei?", caso alguns de meus leitores desconheçam o francês, o que não é improvável, em tempos em que língua estrangeira moderna será inglês ou espanhol.</i><br />
<br />
O português é uma língua difícil, é o que todo mundo diz. Nós brasileiros acreditamos que é muito mais complicado aprender o português do que aprender, por exemplo, o inglês, ou mesmo o chinês! Na realidade, não é bem verdade que o português seja difícil. Em todo caso, certamente não é mais difícil ou complicado do que qualquer outra língua. <br />
<br />
Todas as línguas são complicadas, são difíceis, se as quisermos entender e falar bem, mas são bastante acessíveis se nos limitarmos à mera comunicação básica. No caso de nossa língua-mãe, visto havermos nascido em seu seio e, por isso, sermos, justamente, falantes nativos, não pode haver nada mais fácil para nós do que usá-la em nosso dia a dia. Todo falante nativo de uma língua a domina perfeitamente nesse contexto. A complicação nasce quando queremos usá-la para além da comunicação imediata e cotidiana. Escrever ou ler (dependendo, é claro, daquilo que formos ler ou escrever) pode revelar-se bastante árduo. E mesmo falar em contextos aos quais não estivermos habituados poderá tornar-se algo apavorante. <br />
<br />
Aqueles que frequentaram a escola por alguns bons anos saberão decerto lidar linguisticamente com um número maior de contextos do que aqueles desafortunados que pouca ou nenhuma escola tiveram. Mas, se por um lado a escola nos auxilia, e muito, por outro não deixa de incutir-nos noções equivocadas acerca de nossa própria língua. Não fosse isso, não haveria por aí gente educada (no sentido de instruída) falando tanta bobagem sobre o assunto. <br />
<br />
Recordo-me de ter ouvido uma vez da boca de uma professora de Português que “gratuíto” simplesmente não existia, quando lhe haviam dito que, a despeito de essa palavra não constar assim acentuada no Houaiss e no Aurélio, era assim que as pessoas a pronunciavam, incluindo entre estas até apresentadores de telejornais como o William Bonner. Ora, se as pessoas (e falo de pessoas instruídas) agora entendem ver na sílaba “-tui-” não mais um ditongo e sim um hiato (daí o acento: “-tuí-”), não será a ausência desse fato (largamente documentado) nos dicionários, por melhores que sejam estes, que vai determinar a questão. O fato de ocorrências assim não constarem nos dicionários se deve tão somente à limitação que obras desse tipo necessariamente têm. Você pode até preferir e recomendar a pronúncia ditongada em “gratuito” e “circuito”, mas, uma vez amplamente documentada a pronúncia em hiato dessas palavras (“gratuíto” e “circuíto”), você, ainda mais sendo profissional do idioma, jamais poderá negá-la nem, muito menos, condená-la.<br />
<br />
É preciso aceitar o fato de que uma língua viva sofre alterações com o passar do tempo. Se tais mudanças são para pior ou melhor, tal julgamento, bastante subjetivo, não é suficiente para freá-las. Depois, é necessário entender que mesmo os julgamentos de valor também se alteram. O que hoje é considerado o português vernacular e castiço, ainda ontem era o chamado latim vulgar, ou seja, o latim da ralé. E a passagem do latim vulgar ao português culto se deveu menos ao letramento da população que se valia dessa língua que ao puro e simples enriquecimento de uma camada específica de falantes dela, que, então com posses e pecúnia, entendeu valorizar seu idioma. Mas não o valorizou para todos os falantes, senão apenas para aqueles abastados que dispunham de tempo e meios para cultivá-lo. Os outros... Bem, os outros seguiram “falando errado”. <br />
<br />
Há muitos modos distintos de se falar o mesmo idioma. A valorização de um modo de falar, por o considerarmos talvez superior, mais elevado, culto, etc., não deveria nunca desconsiderar os demais, sob pena de silenciarem-se seus falantes. O mundo em que hoje vivemos, que vem brigando por democracia e igualdade, que busca a compreensão das diferenças e o entendimento dos divergentes, deve procurar ser o palco da aceitação e da fraternidade. Ainda que lá no fundo tendamos a preferir um modo a outro, nada nos autoriza a desrespeitar quem prefira diferentemente.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-6784589211800160162011-07-25T18:02:00.000-03:002011-07-26T10:30:49.618-03:00POR UMA VIDA MELHORJá nem queria mais entrar na celeuma que a publicação do livro didático <i>Por uma vida melhor</i> – da coleção <i>Viver, aprender</i>, distribuída pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) do Ministério da Educação (MEC) – acabou gerando. Por curiosidade, porém, decidi dar uma olhada no livro e fui procurá-lo na internet. Acabei encontrando, em pdf, apenas o capítulo 1 da obra (“Escrever é diferente de falar”), justamente aquele que teria deflagrado a assuada (ver http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/V6Cap1.pdf) <br />
<br />
Se o leitor tiver a paciência de ler esse capítulo, verá que não tem nada de mais. Trata-se de uma aula de Português como tantas outras publicadas ou não em livros específicos para esse fim. O que parece ter detonado a discussão foi o fato de os autores, muito acertadamente, reconhecerem que, “muitas vezes, na norma popular, a concordância acontece de maneira diferente” daquela existente na chamada “norma culta”. Assim, ao lado de “os livros ilustrados mais interessantes estão emprestados”, teríamos formas variantes como “os livro ilustrado mais interessante estão emprestado”. Do mesmo modo, ao lado de construções como “os meninos pegam o peixe”, existiriam variantes como “os menino pega o peixe” ou mesmo “nós pega o peixe”. <br />
<br />
Ora, leitor amigo, que formas assim variantes existam, ninguém que tenha olhos que vejam e ouvidos que ouçam há de duvidar! Que não devam ser ensinadas na escola, tampouco haveria por que discutir-se, mas não em razão, como se tem dito, de serem essas variantes “erradas”, e sim porque formas assim, sendo populares (e, como tais, “corretíssimas” dentro de seu contexto), já se encontram, na maior parte dos casos, muito bem instaladas no repertório linguístico de nossos alunos e vêm com eles para a escola, juntamente com a cultura das telenovelas, o funk, o pagode, o hip-hop e tantas outras manifestações da cultura popular. Caberia à escola apresentar-lhes o que desconhecem, não é verdade? Pois bem, e é isso mesmo que propõem os autores da obra: “Como a linguagem possibilita acesso a muitas situações sociais, a escola deve se preocupar em apresentar a norma culta aos estudantes, para que eles tenham mais uma variedade à sua disposição, a fim de empregá-la quando for necessário. (p.12)<br />
<br />
Ao mencionarem essas formas variantes, típicas do falar popular, os autores do livro parecem no entanto ter procedido de modo bastante adequado, porque corretamente partem do conhecido para o desconhecido, mostrando aos alunos que aquilo que trazem de casa não é o caos, e sim algo que pode ser analisado e compreendido. O livro se destina a alunos da EJA, isto é, a alunos oriundos de classes desfavorecidas socialmente, que voltam à escola para reencontrar o caminho que um dia perderam. Portanto, o que está se dizendo a essas pessoas NÃO É que aquilo que têm, aquilo que são, aquilo que trazem é “errado”, é “defeituoso”, é “feio”, e como tal deva ser abandonado. O que se diz a essas pessoas é que sua cultura linguística faz sentido, muito sentido, sendo por isso uma das tantas manifestações de nossa riquíssima língua portuguesa.<br />
<br />
Vistas as coisas assim, agora é ir aos poucos buscando entender outras variantes do português, ir passo a passo entrando em contato com outras possibilidades de expressão, outras fontes de cultura, as quais, repito, não devem jamais ser vistas como substitutas das antigas e já incorporadas, mas antes como um bem-vindo e oportuno acréscimo ao que já se sabe.<br />
<br />
Para finalizar, gostaria de mencionar um livro sobre a relação linguagem e escola que o leitor interessado por essas questões deveria consultar sem falta. Trata-se, justamente, de <i>Linguagem e escola: uma perspectiva social</i>, de Magda Soares. Tenho comigo a 9ª edição, de 1992, publicada pela Ática na “série fundamentos” (ISBN 85 08 02694 3). A autora, que até onde eu saiba é professora da Universidade Federal de Minas Gerais, faz uma exposição clara e muito bem informada sobre como a questão da linguagem se tem mostrado uma das questões centrais da educação.PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-24041078069385270732011-07-18T12:08:00.000-03:002011-07-18T12:37:28.590-03:00A PSEUDODEMOCRACIADe modo a simplificar a exposição, digamos que há duas formas políticas de se conceberem as relações sociais, e ambas, creio eu, bastante justificáveis. A primeira é a <i>elitista</i>; a segunda, a <i>democrática</i>.<br />
<br />
E digo serem essas formas justificáveis, porque tanto numa como noutra pode sempre nosso convívio encontrar um modo legítimo de ser. Quero com isso dizer que pode muito bem nossa sociedade funcionar sob uma ou outra dessas formas, ainda que partidários testudos de cada um dos lados tendam sempre a pôr em xeque a possibilidade de existência do outro. <br />
<br />
Ora, ainda que tendamos a valorizar modos democráticos de organização social, forçoso é admitir não ser a democracia necessariamente superior em si mesma (o que, em bom latim, se dirá <i>ótima</i>). Outros tempos houve e outros povos (restrinjo-me por conveniência à história do Ocidente) em que abertamente se desfavorecia, e mesmo condenava-se, a democracia, e nem por isso creio acharmo-nos hoje numa posição indubitavelmente superior àquela de tempos idos, a ponto de verdadeiramente convencermo-nos de haver um irrevogável avanço rumo ao melhor, uma “evolução” nas relações humanas. Essa ilusão, infelizmente, terá decerto morrido junto com o séc. XIX.<br />
<br />
O discurso político, como o jurídico, o científico e tantos outros, seguirá invariavelmente o tempo e os costumes do povo onde se vê inserido. Ninguém se apresentará, no Brasil de hoje, por exemplo, como contrário à democracia, visto ser essa forma de organização social entendida hoje como indubitavelmente a melhor. Que não seja assim <i>necessariamente</i>, eis o que deve ficar de imediato bem claro. <br />
<br />
Esse, aliás, é um ponto sobre o qual hoje não me parece demasiado insistir, o de que não seja a democracia um valor em si; trata-se antes de um valor relacional. Tal compreensão decerto legitima uma posição elitista, mas ao fazê-lo dá igualmente como que nova cor à concepção democrática que buscamos defender.<br />
<br />
Uma vez legitimados esses dois modos de se relacionarem politicamente as pessoas, seja na família, seja na escola, seja no bairro, na cidade ou no país, cabe-nos agora entender uma das pragas que vicejam em nossa sociedade, a saber, a <i>pseudodemocracia</i>.<br />
<br />
Em palavras simples, é a pseudodemocracia a atitude aparentemente democrática de alguém que, na verdade, ou não crê, no fundo, nessa forma de organização social, ou, na melhor das intenções, não a compreende em toda sua extensão e, por isso, a adota equívoca ou impropriamente. <br />
<br />
No primeiro caso, temos o hipócrita, o velhaco; no segundo, o simplório, o bronco, que, por melhores intenções que tenha, acaba invariavelmente descontentando a si e aos outros.<br />
<br />
Ambos os casos, porém, se derivam do mesmo engano em que nos achamos hoje de entender que apenas a democracia seja legítima. Ora, diante disso, ninguém quer ser antidemocrático. Todos somos democratas de carteirinha, quando na verdade, infelizmente, não demorará muito a olhos atentos identificarem em nós o hipócrita ou o bronco, ou às vezes quem sabe um misto dos dois.<br />
<br />
Concluo elogiando aqueles corajosos elitistas que se assumem abertamente como tal. Conheci alguns, poucos é verdade, e os leio ainda em menor número nos periódicos de grande estampa. Embora eu tenda sempre a discordar de suas posições, admito que com esses sempre me foi possível dialogar, visto esposarmos de fato posições antagônicas. Já com os pseudodemocratas, onde a possibilidade de diálogo!?<br />
<br />
A morte do diálogo, eis aí talvez a mais triste consequência da pseudodemocracia...PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-47360239842308390672011-07-11T11:56:00.000-03:002011-07-11T11:56:52.618-03:00Se não há, nem pode haver, imaginemos e voilà!Amigo leitor!<br />
<br />
Hoje te dou uma possível tradução para o português da canção "Imagine", de John Lennon. Tu decerto já conhecerás esses versos famosos e hoje clássicos. Pouco importa. Quero apresentar-te como eu entendo que em português poderíamos dizê-los. Cuida que não me ocupei de rimas, ainda que, se o tivesse feito, possivelmente minha tradução teria crescido em valor. Vamos a ela:<br />
<br />
IMAGINE<br />
<br />
Imagine não existir paraíso<br />
É fácil, basta tentar<br />
Nenhum inferno debaixo de nós<br />
E acima apenas o céu<br />
Imagine toda a gente<br />
Vivendo o dia de hoje, o agora<br />
<br />
Imagine não existirem países<br />
Não, não é difícil imaginar isso<br />
Nada por que matar ou morrer<br />
E também nenhuma religião<br />
Imagine toda a gente<br />
Levando a vida na paz<br />
<br />
Podem até dizer que sou um sonhador<br />
Mas é certo que não serei o único<br />
Espero que você venha juntar-se a nós<br />
Para que o mundo seja um só<br />
<br />
Imagine não haver posses<br />
Será que você consegue?<br />
Nenhuma necessidade de ganância ou fome<br />
Um sentimento de fraternidade entre as pessoas<br />
Imagine toda a gente<br />
Compartilhando o mundo inteiro<br />
<br />
Podem até dizer que sou um sonhador<br />
Mas é certo que não sou o único<br />
Espero que você venha unir-se a nós<br />
Para que o mundo possa ser vivido como um só<br />
<br />
Era isso.<br />
<br />
Abraço,<br />
<br />
ConradoPROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-667131226086690910.post-47875771528365564892011-07-01T15:52:00.000-03:002011-07-01T17:32:47.551-03:00Gasta-se mais com pets do que com gente!?Olá, amigos leitores!<br />
<br />
Aqui em casa temos quatro cachorros (com um que mora, desde os tempos em que vivíamos em apartamento, dentro de casa) e dois gatos (estes também "indoor pets"). Minha mulher, meus filhos e eu somos todos, guardadas as proporções, muito carinhosos e atenciosos com os animais. Um dos cachorros, recolhemos da rua em condições, pobrezinho, lastimáveis. Está hoje um cão alegre, sadio e feliz.<br />
<br />
Indignamo-nos com o tratamento horroroso que se dispensa aos animais, sobretudo aos cães e gatos que são em nossa cidade largados ao deus-dará. Pensamos fazer-se urgente uma política pública de cuidados aos animais, com a merecida punição a esses falsos e cuéis "donos".<br />
<br />
Contudo, parece haver um excesso de zelo pelos bichos quando se dá preferência a um cão em detrimento de uma criança, um ser humano. Ou alguém aí é da opinião que se deixe morrer uma criança de preferência a um animal, por mais querido que este venha a ser?<br />
<br />
O texto a seguir, traduzi-o da versão on-line do jornal Corriere della Sera. Que o leitor considere.<br />
<br />
Abraço!<br />
<br />
Conrado<br />
<br />
<b>SE A EUROPA GASTA MAIS COM OS CÃES DO QUE COM OS DIREITOS HUMANOS...</b><br />
<br />
(<i>por <b>Monica Ricci Sargentini</b> -- jornal <b>Corriere della Sera</b> – 1º de julho de 2011</i>)<br />
<br />
A primavera árabe trouxe o vento da democracia ao Oriente Médio e ao norte da África, solicitando às Nações Unidas um esforço adicional para que se faça frente a novas emergências humanitárias. Mas o caixa está quase vazio. O orçamento de que pode dispor a Alta Comissária dos Direitos Humanos, a senhora Navi Pillay, é mísero: 202 milhões de dólares, “valor que os australianos, por exemplo, gastam num único ano pelos ovos de Páscoa ou que representa o custo de três aviões de combate F-16”, disse ontem Pillay numa conferência de imprensa em Genebra.<br />
<br />
Seria necessário um empenho maior. “Peço a todos os Estados que deem mais, a fim de tornar os direitos humanos uma realidade”, acrescentou a sul-africana, no comando do Comissariado desde 2008. A seguir, desfere um golpe no estilo de vida dos cidadãos da UE: “A cifra que os europeus gastaram com seus animais domésticos somente no ano de 2010 (56,8 bilhões de euros) bastaria a financiar o sistema dos direitos humanos integralmente, incluindo aí meu gabinete, e isso por pelo menos 250 anos!”. <br />
<br />
Palavras de fogo, que nos fazem refletir. Quando caminho pelas ruas de Milão, muitas vezes fico a observar as vitrines das <i>pet shops</i>. Algumas delas expõem produtos de superluxo: roupinhas, caminhas coloridas, proteção para as patinhas e tantas outras coisas do tipo, cujo uso não saberia dizer. Sabe-se que hoje em Nova York os cachorros vão ao psicólogo e que muita gente fala de seu <i>pet</i> como se fosse um ser humano.<br />
<br />
Um paradoxo que se afigura ainda mais evidente a quem dedica a vida a ajudar os deserdados da terra. Alguém assim é a irmã Laura Girotto, há 18 anos missionária na Europa, que no <i>Corriere</i> do dia 17 de março passado manifestou a Gian Antonio Stella toda a sua indignação: “ Leio sobre iniciativas para adotar cães a distância. Vejo nos supermercados setores inteiros dedicados a alimentos para animais, a produtos para cuidá-los, a brinquedos confeccionados para eles... Brinquedos! Repito: amo os animais, mas Santo Deus! Em Ádua, cidade no norte da Etiópia, crianças morrem por ninharias, às vezes apenas porque lhes falta um tubo, uma cânula, por onde se possa administrar-lhes um simples soro de reidratação. Uma diarreia infantil é já suficiente para que morra um recém-nascido em 24 horas! Como posso aceitar esse abismo entre a atenção que se dedica aos <i>amigos do homem</i> e o desinteresse que se observa pelo <i>próprio homem</i>?” <br />
<br />
O mesmo tema foi retomado por Maria Volpe no blogue <i>La 27sima ora</i>, numa postagem com o título “Se un cane vale più di un bimbo” (“Se um cão vale mais do que uma criança”), o qual teve a beleza de 574 comentários, ainda que muitos (infelizmente) fossem de insulto à autora do artigo.<br />
<br />
Pois bem, o apaixonado apelo do Alto Comissariado da ONU recoloca o debate na ordem do dia. “Quando considero o dinheiro que vem sendo investido nos direitos humanos, diz a Comissária, me pergunto o quão firme será de fato o empenho das pessoas que defendem os corajosos manifestantes que no Oriente Médio e no norte da África reafirmaram a importância desses direitos”. <br />
<br />
Fica, pois, esta pergunta: por que somos tão avessos a fazer uma doação para ajudar uma criança que morre de fome ao mesmo tempo em que as lojas de objetos para animais domésticos se mostram um negócio da China?PROF. CONRADOhttp://www.blogger.com/profile/06720882909513973026noreply@blogger.com2